12 de julho de 2022

PT admite apreensão com efeitos eleitorais de PEC e traça novo discurso

Campanha de Lula vê risco de auxílios impulsionarem Bolsonaro e frisa pecha de ação eleitoreira do rival
 
Joelmir Tavares
Victoria Azevedo
Catia Seabra



O ex-presidente Lula (PT) em ato da pré-campanha em Diadema no sábado (9), quando sugeriu que eleitores aceitem os auxílios, mas "deem uma banana" para Bolsonaro nas urnas - Marlene Bergamo/Folhapress

A pré-campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) colocou em marcha um discurso para evitar que o pacote de auxílios articulado por Jair Bolsonaro (PL) dê fôlego ao presidente nas pesquisas. A estratégia é reforçar a pecha eleitoreira das medidas e fazer um contraponto com programas do PT.

A PEC (proposta de emenda à Constituição) que libera benefícios sociais com custo estimado em R$ 41,25 bilhões já passou pelo Senado —apoiada inclusive pela oposição ao governo— e teve o texto-base aprovado na Câmara na noite desta terça-feira (12).

Auxiliares desconversam em público sobre efeitos das benesses na liderança de Lula, que marca 47%, segundo o Datafolha, enquanto o adversário tem 28%. Em privado, contudo, há apreensão com o possível ganho de popularidade do rival, o que ameaçaria eventual vitória do petista no primeiro turno.

A PEC autoriza o governo a criar um vale para caminhoneiros e taxistas, dobrar o valor do Auxílio Gás e ampliar o Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 até o fim do ano, entre outros benefícios.

Embora a cúpula da campanha pregue cautela e insista que é preciso observar as consequências práticas, o clima de preocupação ficou evidente com manifestações de Lula e aliados para tentar neutralizar o impacto dos pagamentos.

O principal temor deriva do diagnóstico de que Bolsonaro deu o maior passo até aqui na direção de um eleitorado que já vinha afinado com Lula. Com isso, abre espaço em faixas nas quais o PT se considerava estabilizado.

Petistas avaliam a ofensiva como incapaz de provocar uma ultrapassagem do oponente, mas suficiente para diminuir a distância nas taxas de intenção de voto.

O PT quer explorar o viés de que Bolsonaro só agora, às vésperas do pleito, se mexeu para ajudar os mais pobres e que ele "dá com uma mão e tira com a outra", já que a incapacidade do governo de combater a inflação corrói o poder de compra, diminuindo o valor real do dinheiro.

"Tudo está sendo feito com regras de inconstitucionalidade flagrante, cometendo crime eleitoral, e com fins puramente eleitoreiros", diz o ex-governador do Piauí Wellington Dias (PT). "Erram por achar que os brasileiros são bobos. O povo sabe da enganação e dará o troco na urna."

Uma das táticas é dizer que o governo preparou os pagamentos de forma açodada e subestima a capacidade de discernimento dos eleitores. Ao mesmo tempo, petistas reforçam que os auxílios têm data para acabar.

Lula, que tem comparado a ação bolsonarista a uma tentativa de compra de voto, tentou no sábado (9) sensibilizar os eleitores para que não se vendam em troca de algo tido como incerto e temporário.

Em evento em Diadema, o petista disse que "esse fascista [Bolsonaro] pensa que o povo vai ser tratado como se fosse ignorante ou gado, que ele acha que vai comprar dando um programa para seis meses".

"Se o dinheiro cair na conta de vocês, peguem, e compra o que comer. E, na hora de votar, dê uma banana neles e votem [...] em quem vai cuidar desse país definitivamente", afirmou.

O ex-presidente, em discurso em Brasília, nesta terça, voltou a falar dos auxílios, aos quais se referiu como "vale-sorvete", que "você pega, põe na boca, chupa e acaba, e fica com o palito".

"Nós temos que dizer para ele: se colocar dinheiro na nossa conta, a gente vai pegar, mas o nosso voto ele não vai ter", disse aos apoiadores, questionando o porquê de Bolsonaro, só no fim do mandato, propor os pagamentos a grupos que já necessitavam deles.

Em ato com o petista no Rio de Janeiro, na quinta (7), o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que integra a campanha, disse que, "ao contrário de utilizar-se da pobreza para ganhar as eleições, Lula é o presidente dos pobres, é o governante dos que são de baixo, dos que padecem".

O deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) afirma que a campanha desde o começo trabalhou com a ideia de que esta seria uma "eleição dura" e chamou de "operação boca de urna" a manobra governista.

"Lula é a única certeza de que o povo mais pobre será prioridade nos quatro anos [de mandato], e não apenas às vésperas da eleição", diz ele, que faz parte do círculo próximo do ex-presidente.

Para o secretário nacional de comunicação do PT, Jilmar Tatto, a medida é um sinal de "desespero" do presidente, mas sem maior relevância na corrida eleitoral. Ele diz que a campanha seguirá no debate sobre temas como carestia, miséria e desemprego, relacionando-os ao governo.

A PEC beneficia potencialmente a faixa do eleitorado com renda familiar mensal de até dois salários mínimos, que equivale a 52% da população. É nessa camada que Lula alcança hoje seus resultados mais robustos.

O petista salta dos 47% de intenções de voto na média para 56% no grupo dos mais desvalidos, conforme o Datafolha. Já Bolsonaro, com seus 28% no quadro geral, tem 20% nessa faixa. O petista perde força nos estratos de maior renda, enquanto o atual mandatário faz o movimento inverso.

As pesquisas vêm mostrando que o pagamento do Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família) não afeta significativamente o desempenho de Bolsonaro na briga com Lula —entre os beneficiários, o ex-presidente mantém a dianteira que alcança na média geral.

O petista salta de 47% para 59% entre os que recebem o benefício, enquanto Bolsonaro vai de 28% para 22%. A rejeição ao atual mandatário, que é de 55% na média geral, também é superior dentro da parcela atendida pelo programa: 59% dizem que jamais votariam nele.

Situação semelhante ocorre entre os eleitores com renda familiar de menos de dois salários, independentemente de terem ou não acesso ao auxílio. Nesse segmento, Lula bate 56% de intenção de voto e é rejeitado por 24%. Bolsonaro tem, respectivamente, 20% e 60%.

A avaliação do atual governo pouco oscila quando comparado o grupo geral e os dos mais vulneráveis. A resposta ruim ou péssimo repete o patamar de 50%, enquanto o percentual dos que consideram a gestão boa ou ótima fica em torno de 20%, variando dentro da margem de erro.

A melhor taxa de aprovação de Bolsonaro no mandato, em dezembro de 2020, esteve associada ao pagamento do auxílio emergencial na pandemia. A subida no quesito bom ou ótimo, no entanto, foi detectada somente cerca de cinco meses após o início da distribuição das verbas.

O percentual estava em 33% em abril daquele ano, quando a ajuda passou a ser depositada. A reação só foi percebida em agosto, quando a avaliação positiva bateu 37% e, entre beneficiários do auxílio, chegou a 42%.

Caso o intervalo se repita agora, com uma demora para a eventual melhora nas intenções de voto, o efeito pode não chegar a tempo da eleição.

Analistas consideram arriscado comparar os momentos, por razões sociais —dois anos atrás não se discutia eleição nem estava colocado o embate com Lula— e econômicas —a inflação disparou desde então.

​​Pesquisa da Quaest divulgada na quarta (6) mostrou sinais de recuperação de Bolsonaro e perspectiva promissora com o novo pacote. Entre eleitores de Lula, por exemplo, cerca de 10% dizem que as ações na seara econômica tendem a aumentar a chance de voto no atual presidente.

Temendo desgaste nas urnas, a oposição no Senado votou em peso a favor do texto. A sessão na Câmara seria na quinta (7), mas a falta de quórum levou o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), a adiar a votação, temendo derrota.

A maioria dos parlamentares justificou a posição favorável com o argumento de que negar medidas que podem aliviar o bolso da população teria altíssimo custo em ano eleitoral.

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