Nelson Barbosa
A aproximação das eleições desperta curiosidade sobre as ideias econômicas dos principais candidatos a presidente. Em vez de tentar adivinhar o que cada candidato fará, proponho um exercício alternativo: independentemente de quem for eleito, quais são os temas econômicos inevitáveis para o próximo governo? Minha lista tem pelo menos seis itens.
Primeiro, o teto de gasto caiu na prática, mas falta formalizar a mudança. O novo governo fará uma de duas coisas: mudará a regra fiscal ou pedirá mais uma permissão para gastar acima do limite de despesa previsto para 2023 (outra "PEC extrateto"). Há várias alternativas de regra fiscal em discussão na "casa dos economistas", e o tema voltará no fim deste ano, quando o Congresso analisar a proposta de Orçamento para 2023, a ser apresentada, por Bolsonaro, em agosto.
Segundo, desde 2015, não há correção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). A defasagem dos valores em relação à inflação vem aumentando, e provavelmente veremos propostas de mudança no IRPF ao longo da campanha eleitoral. A mudança pode ser racional, com a maioria da população pagando IRPF de modo mais progressivo do que atualmente, ou populista, simplesmente desonerando a maior parte da população de IRPF. Seja qual for a escolha, o tema voltará em 2023.
Terceiro, no fim deste ano, o Poder Judiciário proporá um reajuste salarial para si mesmo, o que, por sua vez, será aprovado pelo Congresso, que também expandirá o aumento para parlamentares e altos membros do Poder Executivo (presidente e ministros). Esse reajuste e as demandas salariais dos demais servidores federais forçarão o próximo governo a negociar com seus trabalhadores, o que, por sua vez, tende a puxar uma reforma administrativa em 2023.
Quarto, nossa confusão de tributação indireta (PIS, Cofins, ICMS e ISS) cresce a cada dia. Na ausência de uma proposta organizada de reforma tributária por parte do Executivo ou Legislativo, as mudanças vêm acontecendo de modo desorganizado pelo Judiciário. Uma série de decisões judiciais já mudou estruturalmente alguns tributos (exemplo: retirada do PIS e Cofins da base de cálculo do ICMS e redução de ICMS sobre energia). Essas mudanças geram precatórios e elevam a incerteza fiscal, forçando o novo governo a se mover em 2023.
Quinto, a atual desoneração da folha de pagamento vence em dezembro de 2023 e, portanto, o novo governo terá que decidir se prorrogará o sistema ou adotará uma reforma da tributação e encargos sobre a folha. Caso o novo governo escolha a segunda alternativa (tomara que sim), a revisão da desoneração da folha poderá ser combinada com uma revisão da reforma trabalhista para incentivar a criação de empregos formais e aumentar a cobertura previdenciária de trabalhadores autônomos.
Sexto, o adiamento de pagamentos de precatórios, proposto por Bolsonaro e aprovado pelo Congresso, tende a ser derrubado ou revisado pelo Supremo Tribunal Federal. Já houve decisões nesse sentido no passado e, portanto, o próximo governo terá que elaborar uma solução definitiva para o tema. A saída é óbvia: pagar o devido e adotar medidas legais e infralegais para diminuir a geração de novos precatórios. A implementação não é trivial, mas o tema com certeza voltará em 2023.
Sei que, para nós, eleitores, existem temas mais importantes do que os mencionados acima, mas acho bom prestar atenção a questões inevitáveis, pois o sucesso em atender à demanda dos eleitores implica desarmar as bombas programadas para explodir em 2023.
Sobre o autor
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
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