11 de novembro de 2022

Se Lula não atender rápido a anseios da população, governo vai por água abaixo, diz Mantega

Ex-ministro da Fazenda diz que não será titular de pasta e elogiou economistas da equipe de transição

Fábio Pupo


Integrante do governo de transição, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega afirma ser necessário dar prioridade máxima aos mais pobres para o governo não se enfraquecer e que isso está por trás dos questionamentos feitos por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a respeito de exigências fiscais nesta semana.

"Ele não quer começar o governo com as mãos amarradas. Porque, se não, ele não vai longe. Se ele não conseguir atender rapidamente os anseios dessa população, o governo vai por água abaixo", afirma à Folha. "Se ele fizer um governo medíocre como Bolsonaro, ele vai perder força política", diz.

O mais longevo ministro da Fazenda do Brasil diz que não será titular de nenhuma pasta novamente e afirma que Lula foi mal interpretado nesta semana, reforçando o freio de arrumação que o partido resolveu dar um dia depois de a Bolsa cair em decorrência das falas do petista.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, falou mais cedo em responsabilidade fiscal "em primeiro lugar" e falou que o social e as contas públicas podem caminhar juntos.

Guido Mantega foi ministro da Fazenda e presidente do BNDES (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress) - Folhapress

"Não existe antagonismo [entre fiscal e social]", diz Mantega. "Se você ouviu o discurso, ele falou [também] 'olha, eu fui o presidente que mais manteve as contas públicas equilibradas na história do Brasil'", diz o ex-ministro.

No entanto, Mantega ressalta que serão necessários gastos emergenciais no ano que vem e que é preciso estimular a taxa de investimento no Brasil, usando inclusive os cofres públicos —mas também despertando o interesse de investidores privados. "O governo Bolsonaro deixou o investimento cair e tirou o dinamismo na economia. Então nós precisamos recuperar esse dinamismo", afirmou.

Segundo ele, o governo vai precisar de uma licença de R$ 150 bilhões a R$ 200 bilhões fora do teto em 2023 —inclusive para fazer a taxa de crescimento sair do 0,5% estimado por ele em 2023. Mas isso, em sua visão, é um assunto já precificado pelo mercado.

"Esse dinheiro vai voltar, porque essa população [mais pobre] consome. Você vai ter aumento de arrecadação", diz. "Vai ajudar a mobilizar a economia. Quer dizer, não é só um gasto, é também um estímulo", afirma.

Na sequência, durante o ano que vem, deve ser discutida a nova âncora fiscal do país para guiar as expectativas de médio e longo prazo. Há diferentes formatos ainda em discussão e entre os modelos analisados está tirar os investimentos do teto de gastos.

Outro desenho analisado é estabelecer uma lógica para metas de resultado primário que variam conforme a condição da economia —necessidade de maior superávit em momentos de bonança e de um valor menor (ou até déficit) em momentos de esfriamento da economia.

Mas o assunto não é unanimidade nem dentro do PT, conta o ex-ministro. Enquanto não se chega a um consenso, começam a circular versões do que estaria em planejamento. Alguns boatos afirmam que o governo planeja uma ampla revogação do arcabouço fiscal —que incluiria, além do teto de gastos, também a regra de ouro (que evita endividamento para gastos correntes) e a própria meta de resultado primário. "Nunca ouvi falar disso e acho difícil que isso esteja ocorrendo ", diz Mantega.

O ex-ministro diz que seu trabalho na transição se limitará a remontar o antigo Ministério do Planejamento, inclusive para a pasta receber novamente a Secretaria de Orçamento Federal (hoje sob o guarda-chuva da Economia).

Os economistas escolhidos para o governo de transição na área econômica são Persio Arida, André Lara Resende, Nelson Barbosa e Guilherme Mello. Para Mantega, trata-se de uma equipe de altíssimo nível e que reúne pensamentos distintos.

"É o momento agora de a gente aproximar o pensamento para convergir em propostas que sejam satisfatórias para todos", diz. "Não significa que eles vão definir a estratégia. Já tem uma estratégia definida e eles vão ajudar nos detalhes dela", diz.

Mantega concorda com a afirmação de um deles, Arida, de que o governo não pode errar no começo. "Acho que é bastante salutar essa ideia. Não se pode queimar a largada", diz. "Mas também não se pode mergulhar na estagnação que o Bolsonaro deixou. Você não pode ficar na mesma".

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