Idiana Tomazelli, Thaísa Oliveira, Danielle Brant e Marianna Holanda
Folha de S.Paulo
O senador Marcelo Castro (MDB-PI) protocolou nesta segunda-feira (28) o texto da PEC (proposta de Emenda à Constituição) da Transição, que autoriza o governo do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a excluir as despesas com o programa Bolsa Família do teto de gastos por um período de quatro anos.
O texto também prevê a realização de investimentos fora do limite em caso de arrecadação de receitas extraordinárias. Na prática, a proposta não tem um valor específico para essas despesas, mas estimativas do próprio PT apontam para um gasto extrateto de até R$ 198 bilhões com a PEC.
A medida é negociada pelo governo eleito para conseguir manter o benefício mínimo de R$ 600 do Bolsa Família a partir de 1º de janeiro, instituir o pagamento adicional de R$ 150 por criança de até seis anos e honrar outros compromissos de campanha do petista, como a valorização do salário mínimo e a retomada de investimentos.
Senador Marcelo Castro e vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, em reunião no Congresso - Adriano Machado - 16.nov.2022/Reuters |
Apesar de o texto apresentado prever a retirada do Bolsa Família do teto de gastos por quatro anos, integrantes da equipe de transição já admitem negociar uma série de pontos para chegar a uma proposta de maior consenso no Parlamento.
Como mostrou a Folha, o PT discute fixar no texto da PEC da Transição o limite exato para gastos extras no ano de 2023 para ampliar o Bolsa Família e recompor o Orçamento do ano que vem. O formato é defendido por alguns parlamentares e também tem a simpatia do grupo de economia na transição.
A referência atual para esse valor é o cálculo de R$ 150 bilhões feito pelo time da transição como indicativo da margem de expansão das despesas para igualar o que deve ser gasto em 2022, último ano da administração de Jair Bolsonaro (PL).
Um gasto adicional de R$ 150 bilhões manteria constante a relação entre despesa e PIB (Produto Interno Bruto), medida usada para avaliar a dimensão das políticas públicas em comparação ao tamanho da economia. A conta atual é de que a relação despesa/PIB deve ficar em 19% neste ano, enquanto o Orçamento de 2023 foi enviado originalmente com 17,6%.
Outro ponto em negociação é o prazo de duração das medidas excepcionais. Como mostrou a Folha, a cúpula do Congresso indicou que a PEC só tem chances de ser aprovada com validade de dois anos, e interlocutores do governo eleito também admitem ceder nesse ponto.
Castro, que também é relator do Orçamento de 2023, afirmou nesta segunda que "tudo isso vai ser fruto de intensas negociações" e que a proposta inicial, que não estipulava prazo para a exclusão de despesas do teto, foi revista "devido a muitas reações" do Congresso.
"O que está sendo proposto é o prazo de quatro anos. Inicialmente havia a ideia de ser perene a excepcionalização do teto de gastos do Bolsa Família, mas, devido a muitas reações que houve, chegou-se à proposta de quatro anos", declarou na chegada ao CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil), sede da transição.
"É claro que tudo isso vai ser fruto de intensas negociações, e quem cobre o Congresso Nacional sabe que dificilmente uma matéria entra no Congresso e sai da mesma maneira", disse. "Nós combinamos com líderes que nós daríamos entrada e, à medida que a PEC for tramitando na Comissão de Constituição e Justiça, nós vamos então buscando um texto comum."
O líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PT-PA), também disse nesta segunda que o PT está "disposto a conversar". "A PEC vem com a proposta de quatro anos, e nós estamos dispostos a buscar a mediação. O Lula está tomando essas iniciativas, inclusive de vir conversar, para valorizar a boa política e o Parlamento brasileiro", afirmou.
"Fato é que nós dissemos com todas as letras que um ano não era possível, que isso inviabilizava o funcionamento. Porque, na prática, um ano é seis meses, já que o governo tem que mandar a nova LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias] em abril para o Congresso Nacional", afirmou.
A minuta inicial da PEC, apresentada pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) em 16 de novembro, previa a retirada do Auxílio Brasil —que voltará a ser chamado de Bolsa Família— da regra fiscal por tempo indeterminado. No texto protocolado nesta segunda, a lógica foi mantida, mas o prazo foi ajustado para quatro anos.
Outros pontos apresentados no dia 16 foram mantidos. O texto da PEC permite, por exemplo, a destinação de uma parcela das receitas extraordinárias (obtidas, por exemplo, com bônus de assinatura de leilões de petróleo) para custear investimentos públicos fora do teto de gastos. O argumento é que essa despesa teria uma espécie de lastro fiscal, ou seja, só seria realizada mediante o excesso de arrecadação.
A proposta, porém, estipula um limite para essa parcela, equivalente a 6,5% do excesso de arrecadação verificado em 2021 —o que resulta em um valor seja de até R$ 23 bilhões.
A PEC também inclui um dispositivo que permite ao governo usar recursos obtidos por meio de doações na execução de projetos ambientais. A articulação foi feita no dia em que Lula discursou na COP27, a conferência do clima das Nações Unidas, cobrando recursos dos países ricos e colocando o combate à crise climática como prioridade em seu novo governo.
A avaliação é que não faz sentido limitar essas despesas, uma vez que retirá-las do teto estimula parcerias e até mesmo viabiliza novas fontes de financiamento para gastos estratégicos. O Fundo Amazônia, por exemplo, hoje tem dificuldade para estabelecer parcerias com a União diante da falta de espaço no Orçamento.
A mesma lógica seria aplicada às universidades federais, que teriam autorização para executar despesas fora do teto caso elas sejam bancadas com receitas próprias, como doações ou captações. Hoje, esse tipo de gasto fica sujeito ao limite, o que gera reclamações das instituições e engessa projetos de pesquisa.
Sem compensação por elevação de receitas ou corte de outros gastos, a ampliação de despesas na magnitude pretendida pelo PT elevaria o déficit das contas em 2023. O Orçamento projeta oficialmente um rombo de R$ 63,5 bilhões, mas o governo atual atualizou essa estimativa para um número menor, embora ainda negativo em R$ 40,4 bilhões.
A existência de déficits públicos indica que o governo está financiando despesas por meio de emissão de um volume maior da dívida brasileira. O custo fica próximo da taxa básica de juros da economia, a Selic, hoje em 13,75% ao ano.
Com a PEC, o PT pretende resolver o imbróglio da falta de verbas em 2023 e ganhar tempo para discutir a nova regra fiscal que substituirá o teto de gastos. Como o debate sobre o tema é visto como complexo, pode não haver tempo suficiente para aprovar a nova legislação que limita despesas antes da discussão do Orçamento de 2024 –o projeto de lei de diretrizes orçamentárias de 2024, por exemplo, precisa ser entregue ao Congresso em abril de 2023 (em menos de cinco meses).
Uma PEC precisa da assinatura de 27 senadores, um terço da Casa, para começar a tramitar. Castro afirmou que as assinaturas serão apresentadas até esta terça (29).
Integrantes do governo eleito avaliam que é preciso iniciar as discussões na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado até o final desta semana para haver tempo hábil para a votação. Castro ressaltou nesta segunda que a PEC deve ser aprovada no Senado e na Câmara até o dia 16 de dezembro, a tempo de fazer os ajustes no Orçamento de 2023.
Como mostrou a Folha, o PT discute fixar no texto da PEC da Transição o limite exato para gastos extras no ano de 2023 para ampliar o Bolsa Família e recompor o Orçamento do ano que vem. O formato é defendido por alguns parlamentares e também tem a simpatia do grupo de economia na transição.
A referência atual para esse valor é o cálculo de R$ 150 bilhões feito pelo time da transição como indicativo da margem de expansão das despesas para igualar o que deve ser gasto em 2022, último ano da administração de Jair Bolsonaro (PL).
Um gasto adicional de R$ 150 bilhões manteria constante a relação entre despesa e PIB (Produto Interno Bruto), medida usada para avaliar a dimensão das políticas públicas em comparação ao tamanho da economia. A conta atual é de que a relação despesa/PIB deve ficar em 19% neste ano, enquanto o Orçamento de 2023 foi enviado originalmente com 17,6%.
Outro ponto em negociação é o prazo de duração das medidas excepcionais. Como mostrou a Folha, a cúpula do Congresso indicou que a PEC só tem chances de ser aprovada com validade de dois anos, e interlocutores do governo eleito também admitem ceder nesse ponto.
Castro, que também é relator do Orçamento de 2023, afirmou nesta segunda que "tudo isso vai ser fruto de intensas negociações" e que a proposta inicial, que não estipulava prazo para a exclusão de despesas do teto, foi revista "devido a muitas reações" do Congresso.
"O que está sendo proposto é o prazo de quatro anos. Inicialmente havia a ideia de ser perene a excepcionalização do teto de gastos do Bolsa Família, mas, devido a muitas reações que houve, chegou-se à proposta de quatro anos", declarou na chegada ao CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil), sede da transição.
"É claro que tudo isso vai ser fruto de intensas negociações, e quem cobre o Congresso Nacional sabe que dificilmente uma matéria entra no Congresso e sai da mesma maneira", disse. "Nós combinamos com líderes que nós daríamos entrada e, à medida que a PEC for tramitando na Comissão de Constituição e Justiça, nós vamos então buscando um texto comum."
O líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PT-PA), também disse nesta segunda que o PT está "disposto a conversar". "A PEC vem com a proposta de quatro anos, e nós estamos dispostos a buscar a mediação. O Lula está tomando essas iniciativas, inclusive de vir conversar, para valorizar a boa política e o Parlamento brasileiro", afirmou.
"Fato é que nós dissemos com todas as letras que um ano não era possível, que isso inviabilizava o funcionamento. Porque, na prática, um ano é seis meses, já que o governo tem que mandar a nova LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias] em abril para o Congresso Nacional", afirmou.
A minuta inicial da PEC, apresentada pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) em 16 de novembro, previa a retirada do Auxílio Brasil —que voltará a ser chamado de Bolsa Família— da regra fiscal por tempo indeterminado. No texto protocolado nesta segunda, a lógica foi mantida, mas o prazo foi ajustado para quatro anos.
Outros pontos apresentados no dia 16 foram mantidos. O texto da PEC permite, por exemplo, a destinação de uma parcela das receitas extraordinárias (obtidas, por exemplo, com bônus de assinatura de leilões de petróleo) para custear investimentos públicos fora do teto de gastos. O argumento é que essa despesa teria uma espécie de lastro fiscal, ou seja, só seria realizada mediante o excesso de arrecadação.
A proposta, porém, estipula um limite para essa parcela, equivalente a 6,5% do excesso de arrecadação verificado em 2021 —o que resulta em um valor seja de até R$ 23 bilhões.
A PEC também inclui um dispositivo que permite ao governo usar recursos obtidos por meio de doações na execução de projetos ambientais. A articulação foi feita no dia em que Lula discursou na COP27, a conferência do clima das Nações Unidas, cobrando recursos dos países ricos e colocando o combate à crise climática como prioridade em seu novo governo.
A avaliação é que não faz sentido limitar essas despesas, uma vez que retirá-las do teto estimula parcerias e até mesmo viabiliza novas fontes de financiamento para gastos estratégicos. O Fundo Amazônia, por exemplo, hoje tem dificuldade para estabelecer parcerias com a União diante da falta de espaço no Orçamento.
A mesma lógica seria aplicada às universidades federais, que teriam autorização para executar despesas fora do teto caso elas sejam bancadas com receitas próprias, como doações ou captações. Hoje, esse tipo de gasto fica sujeito ao limite, o que gera reclamações das instituições e engessa projetos de pesquisa.
Sem compensação por elevação de receitas ou corte de outros gastos, a ampliação de despesas na magnitude pretendida pelo PT elevaria o déficit das contas em 2023. O Orçamento projeta oficialmente um rombo de R$ 63,5 bilhões, mas o governo atual atualizou essa estimativa para um número menor, embora ainda negativo em R$ 40,4 bilhões.
A existência de déficits públicos indica que o governo está financiando despesas por meio de emissão de um volume maior da dívida brasileira. O custo fica próximo da taxa básica de juros da economia, a Selic, hoje em 13,75% ao ano.
Com a PEC, o PT pretende resolver o imbróglio da falta de verbas em 2023 e ganhar tempo para discutir a nova regra fiscal que substituirá o teto de gastos. Como o debate sobre o tema é visto como complexo, pode não haver tempo suficiente para aprovar a nova legislação que limita despesas antes da discussão do Orçamento de 2024 –o projeto de lei de diretrizes orçamentárias de 2024, por exemplo, precisa ser entregue ao Congresso em abril de 2023 (em menos de cinco meses).
Uma PEC precisa da assinatura de 27 senadores, um terço da Casa, para começar a tramitar. Castro afirmou que as assinaturas serão apresentadas até esta terça (29).
Integrantes do governo eleito avaliam que é preciso iniciar as discussões na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado até o final desta semana para haver tempo hábil para a votação. Castro ressaltou nesta segunda que a PEC deve ser aprovada no Senado e na Câmara até o dia 16 de dezembro, a tempo de fazer os ajustes no Orçamento de 2023.
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