9 de dezembro de 2021

Vêm aí dois meses de debate sobre juro

Até o próximo Copom, em fevereiro, expectativas podem alterar cenário para Selic

Nelson Barbosa



Completo minha sequência de três colunas sobre política monetária (após intervalo na semana passada) com o debate sobre nossa taxa básica de juro.

Em março, quando o Banco Central começou a elevar a Selic, defendi a medida e disse que quem derrubou o juro para 2% merecia um voto de confiança para subir juro diante da aceleração de preços. Mantenho a opinião.

Apesar de a inflação ter subido por razões de oferta (choques desfavoráveis no câmbio, energia, alimentos e combustível), o BC tem de elevar o juro para evitar que os efeitos desses choques gerem um aumento permanente da inflação.

No jargão dos economistas, mesmo quando a inflação não é de demanda, o BC pode ter de elevar a Selic e reduzir a demanda da economia para combater os efeitos secundários dos choques de oferta. Foi assim no fim do governo Fernando Henrique, quando a inflação atingiu 12,5% ao ano.

Foi assim no início do segundo mandato de Dilma, quando a inflação atingiu 10,7% anuais, e está sendo assim agora, com a inflação voltando a 10,7% (acumulado de 12 meses até novembro).

Para os leitores não desanimarem do Brasil, a Selic necessária para debelar a inflação caiu ao longo dos três episódios descritos acima. Em 2003, o BC de Meirelles precisou elevar a Selic para 26,5% para controlar a inflação deixada por Arminio. Em 2015, o BC de Tombini aumentou o juro para 14,25% para controlar a aceleração de preço deixada por... Tombini mesmo (Ilan só administrou a redução posterior).

Agora, o BC de Campos Neto elevou a Selic para 9,25% e disse que, em fevereiro, fará novo aumento, para 10,75%. Como comentei lá em março, quando alguns colegas heterodoxos debatiam se era mesmo necessário subir juro: "Hoje a discussão relevante não é se a Selic deve ou não subir. Ela deve subir. A discussão relevante é quanto a Selic deve subir para eliminar o risco de inflação elevada em 2022".

Pois bem, as apostas atuais são que, para a inflação cair em 2022 e retornar à meta do governo em 2023, a Selic ainda terá que subir para algo entre 11% e 12%. Porém, como 56 dias são uma eternidade no Brasil de Bolsonaro, muita coisa pode acontecer até 2 de fevereiro, quando o Copom (Comitê de Política Monetária) voltará a se reunir para decidir juro.

Nesse intervalo, de quase dois meses, haverá debate intenso entre economistas, sobretudo entre porta-vozes de instituições compradas e vendidas em juro, sobre o tamanho do arrocho monetário adicional. Estou no grupo que prevê mais moderação por dois motivos.

Primeiro, a economia está estagnada e corre risco de recessão em 2022. Dado que os aumentos mais recentes da Selic ainda terão efeitos contracionistas sobre a atividade, talvez não seja necessário subir tanto o juro como o BC prevê agora. Tudo depende das expectativas de mercado sobre o impacto da estagnação do PIB nos preços e, como sempre, da evolução das chuvas no Brasil e dos preços internacionais de commodities.

Segundo, o câmbio está alto e o juro internacional está baixo. Há incentivo para arbitragem de juro entre o Brasil e o resto do mundo, sobretudo se levarmos em conta que, a partir de novembro de 2022, um eventual Lula eleito presidente dissipará a incerteza bolsonarista e a taxa de câmbio cairá, como ocorreu em 2003. Nesse cenário, o ganho de arbitragem de juro aumenta substancialmente, e isso impede depreciação adicional do real.

Por fim, dada a incerteza atual, entendo que o BC tenha sido forçado a sinalizar juro de 10,75% em fevereiro para ganhar tempo e avaliar melhor o cenário antes do próximo movimento.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Guia essencial para a Jacobin

A Jacobin tem divulgado conteúdo socialista em ritmo acelerado desde 2010. Eis aqui um guia prático para algumas das obras mais importantes ...