Governo manteve a agenda de Temer ponte para o passado do Brasil para poucos
Nelson Barbosa
Temer cumprimenta Bolsonaro em sua posse. (Valter Campanato/Agência Brasil) |
O governo Bolsonaro começou com uma retórica de extrema-direita, mas sua equipe basicamente seguiu a agenda centro-direita de Temer na economia, uma "ponte para o passado do Brasil para poucos", adotada após o golpe de 2016 contra o PT.
Do lado fiscal, 2018 terminou com leve contração fiscal, e 2019 começou na mesma direção. Devido ao aperto gradual do teto de gastos de Temer e à manutenção de meta de resultado primário, as autoridades continuaram a praticar o "Orçamento sanfona" em 2019: contingenciar no início do ano (quando há incerteza sobre a receita) e liberar no fim do ano (se a receita vier dentro ou acima do previsto).
Em um repeteco de governos anteriores, no primeiro ano de Bolsonaro houve corte de gasto em janeiro com promessa (cumprida) de liberação a partir de novembro. Houve, também, nova rodada de saques no FGTS, para atenuar o arrocho fiscal.
Em primeiro plano, Michel Temer, de costas e utilizando a faixa presidencial, cumprimenta o presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia de posse. Em segundo plano, militar observa a cena. Ao fundo, multidão. Em primeiro plano, Michel Temer, de costas e utilizando a faixa presidencial, cumprimenta o presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia de posse. Em segundo plano, militar observa a cena. Ao fundo, multidão.
Do lado monetário, a mudança de comando no BC interrompeu a queda de juro, pois o time entrante tinha que manter sua fama de mau. Apesar do lento crescimento da economia, com queda da inflação, herdada do governo Temer, o BC de Campos Neto só começou a reduzir a Selic no segundo semestre. Um erro, pequeno, que seria revertido depois.
A novidade de 2019 era a esperança, dos sócios do "Brasil para poucos", de que a concentração de poderes sob um ministro ultraneoliberal finalmente destravaria as reformas pró-rico e pró-mercado financeiro prometidas por Temer. Guedes não decepcionou nesse quesito.
Houve promessas de mudanças econômicas revolucionárias, geralmente com ganho de R$ 1 trilhão em cada iniciativa, a serem aprovadas em apenas um ano. Como sempre acontece na política, a sociedade respondeu com gradualismo via Congresso.
O ano foi marcado pela inevitável e necessária reforma da Previdência (iniciada por Lula, continuada por Dilma e interrompida por Temer). O projeto começou com promessas equivocadas de adotar o sistema chileno (capitalização via mercado) no Brasil, mas o Congresso soube filtrar as maluquices dos austríacos de circo no governo.
No fim, aprovou-se uma reforma que diminuiu os privilégios dos servidores públicos e finalmente instituiu o regime de aposentadoria somente por idade no Brasil. Houve excessos e insuficiências. Não foi o ideal, pois na política o ótimo é inimigo do bom, mas foi o possível no contexto de 2019.
Provavelmente serão necessários novos ajustes na Previdência nos próximos anos, devido ao envelhecimento da população e, principalmente, às mudanças no mercado de trabalho, que ameaçam tornar o emprego formal uma raridade.
Falta ampliar a inclusão e as bases de financiamento da Previdência, do contrário voltaremos a ter idosos pobres no Brasil, um problema que tinha sido extinto pelos governos do PT.
Fiel à continuidade do governo Temer, o primeiro ano de Bolsonaro também teve lento crescimento e precarização do emprego. Apesar desse cenário, o mercado financeiro comemorou. A Bolsa subiu na expectativa de privatizações e liberalização regulatória e financeira após a reforma da Previdência.
Em mais um episódio do "agora vai" neoliberal, no fim de 2019 a maioria dos analistas econômicos apostava que a agenda de política econômica que tinha dado errado em 2017-19 começaria a dar certo a partir de 2020, com recuperação mais rápida da economia puxada pelo "PIB privado".
Quase ninguém prestou atenção a uma notícia vinda China: um novo vírus que causaria uma flutuação em "V" da economia mundial em 2020-21, meu tema da próxima semana.
Sobre o autor
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
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