Por Seraj Assi
Jacobin
Xá Mohammad Reza Pahlavi e Jimmy Carter durante uma cerimônia de boas-vindas na Casa Branca, Washington, DC, em 15 de novembro de 1977. (Diana Walker / Getty Images) |
Tradução / Por um ano, desde outubro de 2023, os líderes dos EUA aplaudiram o bombardeio implacável de Israel em Gaza, mesmo com o genocídio ali — com financiamento e armas estadunidenses — matando mais de quarenta mil palestinos, cerca de metade deles mulheres e crianças. Os aplausos continuaram enquanto Israel expandiu seus bombardeios para, agora, três outros países árabes: Líbano, Iêmen e Síria.
Ainda insatisfeitos, alguns torcem para que Israel bombardeie o Irã. Joe Biden tem supostamente “discutido” a perspectiva de um ataque israelense aos campos de petróleo iranianos, a tábua de salvação da economia do país, que tem definhado sob um embargo devastador dos EUA por décadas.
Após o bombardeio de mísseis do Irã contra Israel na semana passada, realizado em retaliação aos assassinatos de líderes do Hamas e do Hezbollah por forças israelenses, a vice-presidente e candidata presidencial democrata Kamala Harris chamou a república islâmica de uma “força desestabilizadora e perigosa” no Oriente Médio, abrindo um novo capítulo em uma longa história de agressividade dos EUA contra o Irã. Na segunda-feira passada, ela foi ainda mais longe, chamando o Irã de “maior adversário” dos Estados Unidos.
Uma longa e violenta história
Para aqueles familiarizados com essa história, é difícil ouvir tais declarações sem relembrar a véspera de Ano Novo de 1977, um ano antes da Revolução Iraniana estourar. No calor da crescente agitação civil no Irã, o presidente dos EUA Jimmy Carter compareceu a um luxuoso jantar de estado com o xá iraniano, Mohammad Reza Pahlavi, onde Carter brindou: “O Irã, por causa da grande liderança do xá, é uma ilha de estabilidade em uma das áreas mais problemáticas do mundo”.
Ironicamente, os brindes foram precedidos por uma longa história dos EUA de desestabilização do Irã — uma história marcada por operações secretas e intervenções clandestinas. Vinte e quatro anos antes, durante a “Operação Ajax”, a CIA, em colaboração com o MI6 britânico, orquestrou um golpe que derrubou o primeiro-ministro iraniano democraticamente eleito Mohammed Mossadegh, que venceu com uma plataforma de nacionalização do petróleo e sua retomada do controle ocidental. O golpe pôs em movimento a destruição da emergente democracia do país e assombraria os iranianos pelas próximas décadas.
Começando no final da década de 1940, no calor da Guerra Fria, o governo Harry Truman abraçou o jovem xá como um parceiro importante na emergente aliança antissoviética no Oriente Médio, apesar do crescente ressentimento iraniano pela corrupção do governo e as vendas imprudentes de recursos do Irã para empresas estrangeiras para financiar o estilo de vida luxuoso do mandatário. A onda de gastos do xá o levou a vender direitos exclusivos sobre o petróleo e gás natural do Irã para empresas petrolíferas multinacionais ocidentais, principalmente a Anglo-Iranian Oil Company (AIOC), que explorou os iranianos e exportou milhões de barris de petróleo que deram lucros fabulosos enquanto pagavam praticamente nada ao Irã.
O ressentimento perante o xá logo deu origem à dissidência popular. Em outubro de 1949, Mossadegh, um crítico de longa data da dinastia Pahlavi e um defensor aberto do direito do Irã de controlar sua própria indústria petrolífera, fundou a Frente Nacional, uma ampla coalizão que incluía moderados de classe média e membros do Partido Tudeh, de esquerda. Mossadegh e seus aliados logo mantiveram o equilíbrio de poder no parlamento iraniano, conhecido como Majles, onde concorreram com a plataforma de compartilhar os lucros do petróleo entre o Irã e a AIOC, citando o exemplo de outras empresas petrolíferas multinacionais que operavam na Venezuela e na Arábia Saudita.
Apoiada pelo governo britânico, a AIOC recusou-se a fazer concessões. Os Majles responderam nacionalizando a indústria petrolífera iraniana. Pouco depois, Mossadegh foi eleito primeiro-ministro e imediatamente anunciou planos para arrancar do Reino Unido o controle dos campos de petróleo e refinarias do Irã.
O Ocidente foi rápido em retaliar. Quando Mossadegh avançou com a nacionalização, os governos britânico e americano uniram forças para pressionar o xá a destituir seu novo primeiro-ministro, ameaçando um embargo internacional ao petróleo iraniano, enquanto secretamente planejavam um golpe em Teerã.
O presidente Dwight D. Eisenhower deu sua bênção ao plano. Os arquitetos do golpe foram o secretário de estado dos EUA John Foster Dulles, um anticomunista raivoso que descartou Mossadegh como um fantoche russo e “louco”, e Allen Dulles, o novo diretor da CIA, que tinha laços estreitos com o MI6, o serviço de inteligência britânico, e era um entusiasta de operações secretas contra nações que ele considerava vulneráveis à subversão ou tomada soviética. Kermit Roosevelt, neto de Theodore Roosevelt e um veterano operador secreto da CIA, foi enviado a Teerã para supervisionar o plano.
Agentes americanos e britânicos realizaram o que eles rotularam como um “contragolpe” contra o governo recém-eleito, o que envolveu a distribuição de propinas generosas para mobilizar centenas de mercenários pró-xá, que se espalharam pelas ruas gritando slogans antigovernamentais e encenaram confrontos violentos com os apoiadores de Mossadegh. Enquanto isso, o general Fazlollah Zahedi, amigo do Ocidente, e oficiais militares de direita, juntamente com a polícia secreta iraniana, conhecida como SAVAK, moveram-se para restaurar a ordem e reprimir a dissidência, cercando militantes do Partido Tudeh, prendendo Mossadegh e reintegrando o xá.
Apenas o início
Em nome da luta contra o comunismo, os Estados Unidos ajudaram a sabotar uma democracia próspera no Oriente Médio. Para citar o historiador americano Douglas Little: “Convencido de que o Irã estava prestes a cair para o comunismo, Eisenhower e os irmãos Dulles encorajaram as forças pró-americanas a derrubar um líder iraniano democraticamente eleito e colocar um governante cada vez mais autocrático de volta ao Trono do Pavão.”
O golpe de 1953, conhecido no Irã como o golpe de estado de 28 Mordad, foi um prelúdio para uma longa história de operações secretas de mudança de regime dos EUA contra líderes democraticamente eleitos em todo o Sul Global. Duas décadas depois, no Chile, os Estados Unidos conspiraram infamemente para derrubar o presidente socialista eleito Salvador Allende, ajudando a inaugurar uma ditadura autoritária de direita.
No Irã, o golpe de 1953 foi apenas o início. À medida que o ressentimento iraniano contra o xá crescia, os Estados Unidos responderam com uma nova operação de conversão no Irã no início dos anos 1960. Logo após sua posse, John F. Kennedy elaborou seu próprio plano para conter a agitação civil no Irã: uma “Revolução Branca”. Em abril de 1962, Kennedy, recém-saído do desastre da Baía dos Porcos, convidou o xá Pahlavi para Washington, onde os dois líderes revisaram um “projeto para a estabilidade no Irã”. Nove meses depois, o xá revelou sua Revolução Branca, um pacote de reformas modernizadoras “de cima para baixo”, projetadas para evitar mudanças radicais “de baixo para cima” nos moldes da revolução vermelha de Fidel Castro em Cuba. Na primavera de 1963, voluntários do Corpo da Paz dos EUA aterrissaram no Irã para pregar a modernização americana e, à medida que centenas de corporações americanas começaram a investir no “milagre econômico” do xá, milhões de barris de petróleo fluíram de lá para os aliados dos Estados Unidos na Guerra Fria na Ásia e na Europa Ocidental.
Enquanto isso, os líderes da oposição iraniana, liderados por Ruhollah Khomeini, zombaram do xá como um fantoche americano e denunciaram as reformas apoiadas pelos EUA como “Ocidentoxificação” (Gharbzadegi em persa).
No final da década de 1960, autoridades dos EUA acreditavam que o Irã estava se deleitando com a Revolução Branca do xá. Eles comemoraram enquanto o xá reprimia a dissidência, enquanto brindavam sua decisão de exilar Khomeini, que eles viam como nada mais que um “irritante agitador islâmico”.
Ainda insatisfeitos, alguns torcem para que Israel bombardeie o Irã. Joe Biden tem supostamente “discutido” a perspectiva de um ataque israelense aos campos de petróleo iranianos, a tábua de salvação da economia do país, que tem definhado sob um embargo devastador dos EUA por décadas.
Após o bombardeio de mísseis do Irã contra Israel na semana passada, realizado em retaliação aos assassinatos de líderes do Hamas e do Hezbollah por forças israelenses, a vice-presidente e candidata presidencial democrata Kamala Harris chamou a república islâmica de uma “força desestabilizadora e perigosa” no Oriente Médio, abrindo um novo capítulo em uma longa história de agressividade dos EUA contra o Irã. Na segunda-feira passada, ela foi ainda mais longe, chamando o Irã de “maior adversário” dos Estados Unidos.
Uma longa e violenta história
Para aqueles familiarizados com essa história, é difícil ouvir tais declarações sem relembrar a véspera de Ano Novo de 1977, um ano antes da Revolução Iraniana estourar. No calor da crescente agitação civil no Irã, o presidente dos EUA Jimmy Carter compareceu a um luxuoso jantar de estado com o xá iraniano, Mohammad Reza Pahlavi, onde Carter brindou: “O Irã, por causa da grande liderança do xá, é uma ilha de estabilidade em uma das áreas mais problemáticas do mundo”.
Ironicamente, os brindes foram precedidos por uma longa história dos EUA de desestabilização do Irã — uma história marcada por operações secretas e intervenções clandestinas. Vinte e quatro anos antes, durante a “Operação Ajax”, a CIA, em colaboração com o MI6 britânico, orquestrou um golpe que derrubou o primeiro-ministro iraniano democraticamente eleito Mohammed Mossadegh, que venceu com uma plataforma de nacionalização do petróleo e sua retomada do controle ocidental. O golpe pôs em movimento a destruição da emergente democracia do país e assombraria os iranianos pelas próximas décadas.
Começando no final da década de 1940, no calor da Guerra Fria, o governo Harry Truman abraçou o jovem xá como um parceiro importante na emergente aliança antissoviética no Oriente Médio, apesar do crescente ressentimento iraniano pela corrupção do governo e as vendas imprudentes de recursos do Irã para empresas estrangeiras para financiar o estilo de vida luxuoso do mandatário. A onda de gastos do xá o levou a vender direitos exclusivos sobre o petróleo e gás natural do Irã para empresas petrolíferas multinacionais ocidentais, principalmente a Anglo-Iranian Oil Company (AIOC), que explorou os iranianos e exportou milhões de barris de petróleo que deram lucros fabulosos enquanto pagavam praticamente nada ao Irã.
O ressentimento perante o xá logo deu origem à dissidência popular. Em outubro de 1949, Mossadegh, um crítico de longa data da dinastia Pahlavi e um defensor aberto do direito do Irã de controlar sua própria indústria petrolífera, fundou a Frente Nacional, uma ampla coalizão que incluía moderados de classe média e membros do Partido Tudeh, de esquerda. Mossadegh e seus aliados logo mantiveram o equilíbrio de poder no parlamento iraniano, conhecido como Majles, onde concorreram com a plataforma de compartilhar os lucros do petróleo entre o Irã e a AIOC, citando o exemplo de outras empresas petrolíferas multinacionais que operavam na Venezuela e na Arábia Saudita.
Apoiada pelo governo britânico, a AIOC recusou-se a fazer concessões. Os Majles responderam nacionalizando a indústria petrolífera iraniana. Pouco depois, Mossadegh foi eleito primeiro-ministro e imediatamente anunciou planos para arrancar do Reino Unido o controle dos campos de petróleo e refinarias do Irã.
O Ocidente foi rápido em retaliar. Quando Mossadegh avançou com a nacionalização, os governos britânico e americano uniram forças para pressionar o xá a destituir seu novo primeiro-ministro, ameaçando um embargo internacional ao petróleo iraniano, enquanto secretamente planejavam um golpe em Teerã.
O presidente Dwight D. Eisenhower deu sua bênção ao plano. Os arquitetos do golpe foram o secretário de estado dos EUA John Foster Dulles, um anticomunista raivoso que descartou Mossadegh como um fantoche russo e “louco”, e Allen Dulles, o novo diretor da CIA, que tinha laços estreitos com o MI6, o serviço de inteligência britânico, e era um entusiasta de operações secretas contra nações que ele considerava vulneráveis à subversão ou tomada soviética. Kermit Roosevelt, neto de Theodore Roosevelt e um veterano operador secreto da CIA, foi enviado a Teerã para supervisionar o plano.
Agentes americanos e britânicos realizaram o que eles rotularam como um “contragolpe” contra o governo recém-eleito, o que envolveu a distribuição de propinas generosas para mobilizar centenas de mercenários pró-xá, que se espalharam pelas ruas gritando slogans antigovernamentais e encenaram confrontos violentos com os apoiadores de Mossadegh. Enquanto isso, o general Fazlollah Zahedi, amigo do Ocidente, e oficiais militares de direita, juntamente com a polícia secreta iraniana, conhecida como SAVAK, moveram-se para restaurar a ordem e reprimir a dissidência, cercando militantes do Partido Tudeh, prendendo Mossadegh e reintegrando o xá.
Apenas o início
Em nome da luta contra o comunismo, os Estados Unidos ajudaram a sabotar uma democracia próspera no Oriente Médio. Para citar o historiador americano Douglas Little: “Convencido de que o Irã estava prestes a cair para o comunismo, Eisenhower e os irmãos Dulles encorajaram as forças pró-americanas a derrubar um líder iraniano democraticamente eleito e colocar um governante cada vez mais autocrático de volta ao Trono do Pavão.”
O golpe de 1953, conhecido no Irã como o golpe de estado de 28 Mordad, foi um prelúdio para uma longa história de operações secretas de mudança de regime dos EUA contra líderes democraticamente eleitos em todo o Sul Global. Duas décadas depois, no Chile, os Estados Unidos conspiraram infamemente para derrubar o presidente socialista eleito Salvador Allende, ajudando a inaugurar uma ditadura autoritária de direita.
No Irã, o golpe de 1953 foi apenas o início. À medida que o ressentimento iraniano contra o xá crescia, os Estados Unidos responderam com uma nova operação de conversão no Irã no início dos anos 1960. Logo após sua posse, John F. Kennedy elaborou seu próprio plano para conter a agitação civil no Irã: uma “Revolução Branca”. Em abril de 1962, Kennedy, recém-saído do desastre da Baía dos Porcos, convidou o xá Pahlavi para Washington, onde os dois líderes revisaram um “projeto para a estabilidade no Irã”. Nove meses depois, o xá revelou sua Revolução Branca, um pacote de reformas modernizadoras “de cima para baixo”, projetadas para evitar mudanças radicais “de baixo para cima” nos moldes da revolução vermelha de Fidel Castro em Cuba. Na primavera de 1963, voluntários do Corpo da Paz dos EUA aterrissaram no Irã para pregar a modernização americana e, à medida que centenas de corporações americanas começaram a investir no “milagre econômico” do xá, milhões de barris de petróleo fluíram de lá para os aliados dos Estados Unidos na Guerra Fria na Ásia e na Europa Ocidental.
Enquanto isso, os líderes da oposição iraniana, liderados por Ruhollah Khomeini, zombaram do xá como um fantoche americano e denunciaram as reformas apoiadas pelos EUA como “Ocidentoxificação” (Gharbzadegi em persa).
No final da década de 1960, autoridades dos EUA acreditavam que o Irã estava se deleitando com a Revolução Branca do xá. Eles comemoraram enquanto o xá reprimia a dissidência, enquanto brindavam sua decisão de exilar Khomeini, que eles viam como nada mais que um “irritante agitador islâmico”.
Entraram Richard Nixon e Henry Kissinger. Desesperado para impulsionar a expansão dos EUA no Oriente Médio e sair do atoleiro do Vietnã, o governo Nixon olhou para o Irã monárquico como um representante dos EUA. Em 1972, a dupla visitou Teerã, onde apresentou ao xá sua “doutrina Nixon”: em troca da ajuda estadunidense para garantir a estabilidade política no Irã, os Estados Unidos permitiriam que o xá comprasse sistemas de armas não nucleares de seu arsenal, incluindo helicópteros de ataque, caças a jato e fragatas de mísseis guiados.
O xá abraçou a nova Doutrina Nixon com entusiasmo, embarcando em compras luxuosas de US$ 13 bilhões em equipamentos militares dos EUA a partir do aumento da receita gerada pelos preços exorbitantes do petróleo após a Guerra Árabe-Israelense de 1973 e o embargo árabe do petróleo. Mas o boom do petróleo apenas alienou as classes média e trabalhadora iranianas, que viam com crescente desdém os gastos perdulários do xá em armas dos EUA. Tumultos irromperam nas ruas do Irã e foram recebidos com uma repressão brutal pelo xá, com a bênção estadunidense.
De seu exílio no Iraque, o cada vez mais popular Khomeini condenou o derramamento de sangue, pedindo a derrubada do tirano apoiado pelos EUA. A Revolução Iraniana logo estava em andamento.
Em 16 de janeiro de 1979, o xá Pahlavi embarcou em um Boeing 707 no aeroporto de Mehrabad, em Teerã, e seguiu, após uma breve parada no Egito, para o exílio nos Estados Unidos. Para muitos iranianos, dar refúgio ao xá foi um lembrete amargo da conspiração da CIA para derrubar Mossadegh: os Estados Unidos, ao que parecia, eram uma superpotência desonesta que recompensava tiranos repudiados e punia líderes legitimamente eleitos.
Depois da Revolução
Duas semanas após a fuga do xá, Khomeini retornou ao Irã pela primeira vez após quinze anos de exílio, prometendo estabelecer uma República Islâmica e jurando limpar o país de toda influência restante do “Grande Satanás”. Khomeini e seus apoiadores derrotaram as forças de esquerda que ajudaram a derrubar o xá e logo criaram seu próprio Estado autoritário, embora tenha conquistado apoio popular por sua oposição ao imperialismo dos EUA.
No entanto, os Estados Unidos continuaram a chafurdar no negacionismo. As elites estadunidenses raramente se preocupavam em entender os movimentos políticos islâmicos, ou a marca particular de xiismo de Khomeini. Eles nunca reconheceram que os sentimentos antiamericanos inflamados no Irã não eram religiosos ou culturais em origem, ou o produto de um “choque de civilizações” ou algum outro absurdo a-histórico, mas tinham raízes na longa história dos Estados Unidos de intromissão no país e seu apoio à ditadura do xá.
Quando Ronald Reagan assumiu o poder em 1980, o Irã estava preso em uma guerra cada vez mais sangrenta com o Iraque, que durou oito anos e custou meio milhão de vidas, a maioria delas iranianas. Ansioso para acertar velhas contas com o Irã, o governo Reagan ficou do lado do Iraque, fornecendo a Saddam Hussein armas e aeronaves, inteligência militar e bilhões de dólares em crédito. Isso não impediu Reagan de aprovar ilegalmente um acordo de “armas por reféns” com o governo Khomeini no escândalo amplamente conhecido como o caso Irã-Contra.
A guerra Irã-Iraque terminou em um impasse. Encorajado por sua parceria com os estadunidenses, Hussein invadiu o Kuwait três anos depois, e os Estados Unidos logo estavam lutando contra seu antigo aliado e novo pária no Iraque.
Travada na hostilidade
Desde então, a política dos EUA em relação ao Irã foi marcada por queixas passadas e travada em hostilidade a-histórica. Para não ser ofuscado por seus antecessores, Bill Clinton adotou uma política de “dupla contenção”, que empregou sanções econômicas paralisantes e ameaças militares preventivas para enfraquecer o Irã, culminando na assinatura da Lei de Sanções ao Irã e à Líbia de 1996 (ILSA).
Enquanto isso, os líderes iranianos tentaram consertar pontes com os Estados Unidos com uma série de gestos de boa vontade. Em maio de 1997, os iranianos elegeram o moderado islâmico e reformista Mohammad Khatami como presidente, que estenderia um ramo de oliveira aos Estados Unidos, apenas para ser recebido com a profunda animosidade e suspeita da administração Clinton, e suas exigências inabaláveis de que o Irã encerrasse seu programa de pesquisa nuclear, conforme expresso no Iran Nonproliferation Act de 2000.
Sob George W. Bush, os neoconservadores fizeram da desestabilização do Irã uma política oficial, novamente apesar do alcance iraniano. Horas após o 11 de setembro, Khatami enviou condolências a Bush, enquanto milhares de jovens iranianos fizeram uma vigília à luz de velas nas ruas de Teerã. Bush respondeu rotulando o Irã como um regime terrorista e um membro do “Eixo do Mal”, junto com o Iraque e a Coreia do Norte. (Ou a “Maldição”, na versão mais recente de Benjamin Netanyahu, que inclui Gaza e Líbano.)
Quando, quatorze meses depois, as tropas dos EUA invadiram o Iraque para depor Saddam Hussein, foi a vez de Khatami condenar os Estados Unidos. Alguns dos principais conselheiros de Bush, incluindo o vice-presidente Dick Cheney, acolheram reservadamente a perspectiva de um ataque preventivo israelense contra o complexo nuclear iraniano de Bushehr, e até mesmo planejaram uma mudança de regime em Teerã. Insatisfeito com sua destruição gratuita do Iraque, o próprio Bush ordenaria ao Pentágono que planejasse um ataque às instalações nucleares do Irã, como o ex-presidente se gaba em suas memórias.
Ao optar persistentemente por punição econômica e buscar soluções militares para enfraquecer o país, os Estados Unidos sempre erraram em relação ao Irã — seja a CIA derrubando o primeiro-ministro democraticamente eleito Mossadegh; ou Carter dando refúgio ao xá autoritário; ou Reagan enviando armas ao Iraque durante a Guerra Irã-Iraque; ou George W. Bush rejeitando um acordo nuclear com o Irã; ou Donald Trump sabotando o acordo nuclear de Barack Obama com o Irã e levando a cabo o assassinato de Qassem Soleimani; ou o governo Biden belicista contra o Irã em um momento de crescente conflito regional, atiçando as chamas de uma guerra maior — além de enviar milhares de soldados americanos para a região e garantir um pacote de ajuda militar de US$ 8,7 bilhões para Israel.
O xá abraçou a nova Doutrina Nixon com entusiasmo, embarcando em compras luxuosas de US$ 13 bilhões em equipamentos militares dos EUA a partir do aumento da receita gerada pelos preços exorbitantes do petróleo após a Guerra Árabe-Israelense de 1973 e o embargo árabe do petróleo. Mas o boom do petróleo apenas alienou as classes média e trabalhadora iranianas, que viam com crescente desdém os gastos perdulários do xá em armas dos EUA. Tumultos irromperam nas ruas do Irã e foram recebidos com uma repressão brutal pelo xá, com a bênção estadunidense.
De seu exílio no Iraque, o cada vez mais popular Khomeini condenou o derramamento de sangue, pedindo a derrubada do tirano apoiado pelos EUA. A Revolução Iraniana logo estava em andamento.
Em 16 de janeiro de 1979, o xá Pahlavi embarcou em um Boeing 707 no aeroporto de Mehrabad, em Teerã, e seguiu, após uma breve parada no Egito, para o exílio nos Estados Unidos. Para muitos iranianos, dar refúgio ao xá foi um lembrete amargo da conspiração da CIA para derrubar Mossadegh: os Estados Unidos, ao que parecia, eram uma superpotência desonesta que recompensava tiranos repudiados e punia líderes legitimamente eleitos.
Depois da Revolução
Duas semanas após a fuga do xá, Khomeini retornou ao Irã pela primeira vez após quinze anos de exílio, prometendo estabelecer uma República Islâmica e jurando limpar o país de toda influência restante do “Grande Satanás”. Khomeini e seus apoiadores derrotaram as forças de esquerda que ajudaram a derrubar o xá e logo criaram seu próprio Estado autoritário, embora tenha conquistado apoio popular por sua oposição ao imperialismo dos EUA.
No entanto, os Estados Unidos continuaram a chafurdar no negacionismo. As elites estadunidenses raramente se preocupavam em entender os movimentos políticos islâmicos, ou a marca particular de xiismo de Khomeini. Eles nunca reconheceram que os sentimentos antiamericanos inflamados no Irã não eram religiosos ou culturais em origem, ou o produto de um “choque de civilizações” ou algum outro absurdo a-histórico, mas tinham raízes na longa história dos Estados Unidos de intromissão no país e seu apoio à ditadura do xá.
Quando Ronald Reagan assumiu o poder em 1980, o Irã estava preso em uma guerra cada vez mais sangrenta com o Iraque, que durou oito anos e custou meio milhão de vidas, a maioria delas iranianas. Ansioso para acertar velhas contas com o Irã, o governo Reagan ficou do lado do Iraque, fornecendo a Saddam Hussein armas e aeronaves, inteligência militar e bilhões de dólares em crédito. Isso não impediu Reagan de aprovar ilegalmente um acordo de “armas por reféns” com o governo Khomeini no escândalo amplamente conhecido como o caso Irã-Contra.
A guerra Irã-Iraque terminou em um impasse. Encorajado por sua parceria com os estadunidenses, Hussein invadiu o Kuwait três anos depois, e os Estados Unidos logo estavam lutando contra seu antigo aliado e novo pária no Iraque.
Travada na hostilidade
Desde então, a política dos EUA em relação ao Irã foi marcada por queixas passadas e travada em hostilidade a-histórica. Para não ser ofuscado por seus antecessores, Bill Clinton adotou uma política de “dupla contenção”, que empregou sanções econômicas paralisantes e ameaças militares preventivas para enfraquecer o Irã, culminando na assinatura da Lei de Sanções ao Irã e à Líbia de 1996 (ILSA).
Enquanto isso, os líderes iranianos tentaram consertar pontes com os Estados Unidos com uma série de gestos de boa vontade. Em maio de 1997, os iranianos elegeram o moderado islâmico e reformista Mohammad Khatami como presidente, que estenderia um ramo de oliveira aos Estados Unidos, apenas para ser recebido com a profunda animosidade e suspeita da administração Clinton, e suas exigências inabaláveis de que o Irã encerrasse seu programa de pesquisa nuclear, conforme expresso no Iran Nonproliferation Act de 2000.
Sob George W. Bush, os neoconservadores fizeram da desestabilização do Irã uma política oficial, novamente apesar do alcance iraniano. Horas após o 11 de setembro, Khatami enviou condolências a Bush, enquanto milhares de jovens iranianos fizeram uma vigília à luz de velas nas ruas de Teerã. Bush respondeu rotulando o Irã como um regime terrorista e um membro do “Eixo do Mal”, junto com o Iraque e a Coreia do Norte. (Ou a “Maldição”, na versão mais recente de Benjamin Netanyahu, que inclui Gaza e Líbano.)
Quando, quatorze meses depois, as tropas dos EUA invadiram o Iraque para depor Saddam Hussein, foi a vez de Khatami condenar os Estados Unidos. Alguns dos principais conselheiros de Bush, incluindo o vice-presidente Dick Cheney, acolheram reservadamente a perspectiva de um ataque preventivo israelense contra o complexo nuclear iraniano de Bushehr, e até mesmo planejaram uma mudança de regime em Teerã. Insatisfeito com sua destruição gratuita do Iraque, o próprio Bush ordenaria ao Pentágono que planejasse um ataque às instalações nucleares do Irã, como o ex-presidente se gaba em suas memórias.
Ao optar persistentemente por punição econômica e buscar soluções militares para enfraquecer o país, os Estados Unidos sempre erraram em relação ao Irã — seja a CIA derrubando o primeiro-ministro democraticamente eleito Mossadegh; ou Carter dando refúgio ao xá autoritário; ou Reagan enviando armas ao Iraque durante a Guerra Irã-Iraque; ou George W. Bush rejeitando um acordo nuclear com o Irã; ou Donald Trump sabotando o acordo nuclear de Barack Obama com o Irã e levando a cabo o assassinato de Qassem Soleimani; ou o governo Biden belicista contra o Irã em um momento de crescente conflito regional, atiçando as chamas de uma guerra maior — além de enviar milhares de soldados americanos para a região e garantir um pacote de ajuda militar de US$ 8,7 bilhões para Israel.
Os Estados Unidos têm trabalhado para desestabilizar o Irã por quase um século. Com o candidato presidencial democrata mais uma vez fazendo tiradas agressivas contra o Irã enquanto apoia o novo ataque de Israel ao Líbano, as autoridades americanas parecem não ter aprendido nada com a história.
Colaborador
Seraj Assi é um escritor palestino que vive em Washington, DC, e autor, mais recentemente, de My Life As An Alien (Tartarus Press).
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