Robert H. Wade
Tradução / A 26 de Março, o Presidente Biden, falando em Varsóvia, disse, improvisando: “Por amor de Deus, este homem [Putin] não pode permanecer no poder”. Uma declaração tão explícita de intenção de mudança de regime na Rússia não foi bem sucedida na maior parte da Europa. O Secretário de Estado norte-americano Antony Blinken esclareceu mais tarde a observação de Biden em Varsóvia: “Como sabe, e como nos tem ouvido dizer repetidamente, não temos uma estratégia de mudança de regime na Rússia, ou em qualquer outro lugar, aliás”. Blinken parece ter esquecido o Vietname, o Chile, o Iraque, o Afeganistão, e bastantes mais outros.
Considere as seguintes citações. A 24 de Fevereiro, durante uma conferência de imprensa da Casa Branca no primeiro dia da invasão da Rússia, Biden disse que as sanções não se destinam a impedir a invasão, mas sim a punir a Rússia depois da invasão “... para que o povo da Rússia saiba o que ele lhes trouxe”. É só disso que se trata”.
A 27 de Fevereiro, James Heappey, ministro britânico das Forças Armadas, escreveu no Daily Telegraph: “O seu fracasso deve ser completo; a soberania ucraniana deve ser restaurada, e o povo russo deve ter o poder de ver o pouco que ele se preocupa com eles. Ao mostrar-lhes isso, os dias de Putin como Presidente serão certamente contados... Ele perderá o poder e não poderá escolher o seu sucessor”. Finalmente, a 1 de Março, o porta-voz de Boris Johnson disse que as sanções contra a Rússia “que estamos a introduzir, que grandes partes do mundo estão a introduzir, são para derrubar o regime de Putin”.
Estas declarações reflectem a estratégia de longa data dos EUA para a mudança de regime em Moscovo, tendo a Ucrânia como pivô. Por um lado, enviar suficiente equipamento militar e outro à Ucrânia para afundar num pântano os militares russos. Por outro lado, impor sanções severas e de longo alcance à Rússia, de modo a causar grandes perturbações à elite russa e uma grande contracção das condições de vida da classe média russa. A combinação deveria durar o tempo suficiente para os russos se levantarem para derrubar Putin e instalar um Presidente tipo Ieltsin, mais simpático ao Ocidente.
Mas esta estratégia de armas-mais-sanções precisava de uma causa. A invasão de Putin foi o casus belli necessário. De modo algum desculpa a invasão da Rússia e as suas tácticas desprezíveis dizer que o Kremlin caiu numa armadilha dos EUA e da NATO.
Duas mega forças em confronto
Os nossos meios de comunicação social “livres” tenderam a cingir-se à narrativa de um “malvado e revanchista Putin” atacando “a inocente e unificada Ucrânia, como um primeiro passo para a conquista de outras partes da Europa Central e Oriental e para a restauração da antiga União Soviética”.
A crise da Ucrânia expressa o choque de duas mega-forças moldanado a ordem mundial. Uma é a afirmação de longa data dos EUA de “primazia” ou “hegemonia” em relação a todos os outros Estados. Os Presidentes Putin e Xi (assim como muitos no Ocidente) falam frequente e com agrado do declínio dos EUA e da fractura do Ocidente, especialmente desde a crise financeira do Atlântico Norte de 2008. No entanto o que é surpreendente na resposta dos EUA e do Ocidente à invasão da Rússia é a forma como os EUA têm mobilizado outros estados ocidentais - e muito importante, as empresas multinacionais ocidentais - para isolar um estado proeminente do G20 e antigo membro do G8.
A outra mega força em confronto é a ambição do Estado russo de se constituir como o centro da política, cultura e economia euro-asiática. Este impulso de longo prazo é incompreendido pelo enfoque em Putin - a sua ambição e o seu estado de espírito. Jane Burbank, professora emeritus de História e estudos russos e eslavos na Universidade de Nova Iorque, lembra-nos: “Desde os anos 90, planos para reunir a Ucrânia e outros estados pós-soviéticos numa superpotência transcontinental têm vindo a fermentar na Rússia. Uma teoria revitalizada do império eurasiático informa cada movimento do Sr. Putin”.
De facto, desde o colapso do império russo em 1917, uma linha de pensadores russos tem desenvolvido uma ideologia do eurasianismo. Foi suprimida durante o período soviético, mas eclodiu durante a perestroika no final dos anos 80. A ideologia coloca não só a América, mas todo o mundo atlântico como o adversário da Rússia no “choque de civilizações”, com a ortodoxia russa aproveitada como a cola na guerra geopolítica que se avizinha. Sob Putin, os temas da glória imperial e da vitimização ocidental foram elevados ao centro das atenções em todo o país.
Como Burbank explica, a Ucrânia figurava nesta ideologia eurasiática como um obstáculo desde o início. Os ideólogos eurasianos dos anos 20 já falavam do “problema da Ucrânia”, apresentando a Ucrânia como excessivamente “individualista” e insuficientemente ortodoxa. Ideólogos proeminentes dos anos 90 identificavam a soberania ucraniana como, nas palavras de um deles, um “enorme perigo para toda a Eurásia”. O projecto russo da Eurásia, disse, exigia, como “imperativo absoluto”, o controlo total de toda a costa norte do Mar Negro. A Ucrânia tinha de se tornar “um sector puramente administrativo do Estado centralizado russo”.
Esta é a ideologia que motivou Putin, que o levou a declarar a Ucrânia como “uma colónia com um regime fantoche” na véspera da invasão. Esta é a ideologia que inspira e justifica a seus olhos a sua guerra brutal.
A estratégia dos EUA e da OTAN
Tendo sintetizado a ambição de Putin e do Estado russo, voltamos à estratégia dos EUA e da NATO para a Ucrânia e a Rússia. Baseio-me num esclarecedor ensaio de Joe Lauria, que expõe os motivos ulteriores dos EUA e da NATO na crise da Ucrânia: acabar com o regime de Putin e substituí-lo por um amigo e subordinado dos EUA.
A estratégia dos EUA para a mudança de regime em Moscovo está há muito em preparação. Em 2013 (antes do Presidente Yanukovych da Ucrânia ser derrubado em 2014), Carl Gershman, Director do National Endowment for Democracy (NED), escreveu: “A Ucrânia é o maior prémio”. Explicou que se ela pudesse ser afastada da Rússia e voltada para o Ocidente, “Putin pode encontrar-se no extremo perdedor não só no estrangeiro visinho, mas dentro da própria Rússia”.
Esta estratégia ampla para conter a Rússia é o contexto para compreender a expansão dos membros da NATO ao longo das fronteiras da Rússia, desde o Báltico até à Bulgária, e a presença de 30.000 tropas Nato-atribuídas. Também ajuda a compreender a intervenção militar dos EUA e de alguns outros estados ocidentais para derrubar o governante da Síria, Bashar al-Assad, aliado da Rússia, bem como a política de encorajar as ONG norte-americanas a fomentar agitação na Rússia.
Desde 2015, a CIA tem vindo a supervisionar um programa secreto de treino intensivo nos EUA para as forças de operações especiais de elite ucranianas e outro pessoal dos serviços secretos. A 13 de Janeiro, foi noticiado que as forças formadas pela CIA “poderiam em breve desempenhar um papel crítico na fronteira oriental da Ucrânia, onde as tropas russas se concentraram no que muitos temem ser a preparação para uma invasão”. Um antigo oficial da CIA explicou: “Os Estados Unidos estão a treinar uma insurreição”. Não é surpresa que Moscovo tenha há muito lido as acções dos EUA e da NATO como sendo profundamente hostis e destinadas a produzir uma “mudança de regime” no Kremlin.
A contagem decrescente para a invasão da Rússia
Em 2014, o presidente democraticamente eleito Yanukovych - explicitamente amigo tanto da UE como de Moscovo - foi derrubado num golpe (com substancial apoio dos EUA). A 23 de Fevereiro, no dia seguinte à fuga de Yanukovych, o primeiro acto do parlamento ucraniano foi revogar o estatuto legal do russo como língua nacional; e, mais amplamente, impedir as regiões de permitirem a utilização de qualquer outra língua que não o ucraniano. O governo decidiu bloquear o acesso a notícias, canais de televisão e rádio russos. Ao longo dos meses seguintes, o governo, os meios de comunicação social e largos sectores da população cantaram o lema “Uma Nação, Uma Língua, Um Povo”.
Estes foram actos flagrantemente beligerantes em relação a uma grande minoria. É fácil de compreender porque é que os muitos milhões de falantes de russo se sentiram sob um cerco envenenado; e porque se sentiram encorajados pelo apoio do poderoso Estado à sua porta. O facto de a legislação linguística não ter sido então posta em vigor não “fez com que tudo voltasse de repente a ficar bem”. Os esforços para marginalizar os falantes de russo continuaram.
As populações das províncias orientais de Donetsk e Luhansk em grande parte falantes de russo e crentes ortodoxos votaram a favor da independência em relação à Ucrânia. O governo de Kyiv (maioritariamente ucraniano e católico) lançou uma guerra contra estas províncias para esmagar a sua resistência.
Avançemos até Dezembro de 2021. O Kremlin apresentou propostas de tratado, que incluíam a implementação dos acordos de paz de Minsk já com oito anos de idade (que incluem um compromisso de não adesão da Ucrânia à NATO); a dissolução das milícias ucranianas de extrema-direita; e o envolvimento em negociações sérias sobre uma nova arquitectura de segurança na Europa. Os EUA e a NATO recusaram-se consistentemente a negociar. E ao recusar, avisaram também o mundo, a partir de Dezembro de 2021, de que a Rússia iria invadir. E transferiram enormes quantidades de armas e treinaram os militares ucranianos.
A 19 de Fevereiro, o Presidente Zelensky fez um apaixonado discurso na Conferência de Segurança de Munique, insistindo que a Ucrânia deve ter um caminho aberto para se juntar à NATO, e lamentando que a Ucrânia tivesse desistido do seu arsenal nuclear no final da União Soviética, então o terceiro maior do mundo. Na terceira semana de Fevereiro, os militares ucranianos aumentaram dramaticamente os seus bombardeamentos das províncias de Donetsk e Luhansk, como relatado pelos observadores da OSCE como foi relatado por observadores da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa). É provável que este aumento no ataque ucraniano tenha tido a bênção dos EUA e da NATO.
Até este ponto, o Kremlin não tinha reconhecido as duas repúblicas de Donbass; tinha-se aguentado durante oito anos. Agora, à medida que os militares ucranianos intensificavam o seu ataque, o Kremlin tinha de decidir. Entrou na guerra civil em curso a fim de proteger as repúblicas Donbass dos intensificados ataques militares ucranianos, e numa escala suficientemente grande para que pudesse substituir o governo nacional.
A armadilha colocada pelos EUA
Parece agora que o Kremlin caiu numa armadilha (e dizer isto não é - repito - uma tentativa de desculpar as acções da Rússia). A armadilha tem semelhanças com a armadilha que os EUA montaram a Saddam Hussein em 1990, quando afirmaram que não ir interferir na disputa do seu governo com o Kuwait. Saddam invadiu o Kuwait, o que deu aos EUA o casus belli para destruir as forças armadas iraquianas.
A armadilha também tem semelhanças com uma que a CIA colocou a Moscovo há quatro décadas, ao armar os mujahideen para combater o governo apoiado pelos soviéticos no Afeganistão. Os EUA pretendiam que Moscovo enviasse os seus militares para defender o governo, o que fez em 1979. O conselheiro de segurança nacional do Presidente Carter, Zbigniew Brzezinski, numa entrevista em 1998 ao Le Nouvel Observateur, admitiu alegremente que os EUA tinham armado uma armadilha:
Efectivamente, foi a 3 de Julho de 1979 que o Presidente Carter assinou a primeira directiva de ajuda secreta aos opositores do regime pró-soviético em Cabul. E nesse mesmo dia, escrevi uma nota ao presidente em que expliquei que, na minha opinião, esta ajuda iria induzir uma intervenção militar soviética… Essa operação secreta foi uma excelente Ideia. Tinha o efeito de atrair os russos para a armadilha afegã [registe a sua fraseI e queria que o lamentasse? No dia em que os soviéticos atravessaram oficialmente a fronteira, escrevi ao Presidente Carter, essencialmente: “ temos agora a oportunidade de dar à URSS a sua guerra do Vietname”. De facto, durante quase 10 teve que prosseguir uma Guerra que era insustentável para o regime, um conflito que trouxe desmoralização e, finalmente, a desagregação do império soviético.
Considere as seguintes citações. A 24 de Fevereiro, durante uma conferência de imprensa da Casa Branca no primeiro dia da invasão da Rússia, Biden disse que as sanções não se destinam a impedir a invasão, mas sim a punir a Rússia depois da invasão “... para que o povo da Rússia saiba o que ele lhes trouxe”. É só disso que se trata”.
A 27 de Fevereiro, James Heappey, ministro britânico das Forças Armadas, escreveu no Daily Telegraph: “O seu fracasso deve ser completo; a soberania ucraniana deve ser restaurada, e o povo russo deve ter o poder de ver o pouco que ele se preocupa com eles. Ao mostrar-lhes isso, os dias de Putin como Presidente serão certamente contados... Ele perderá o poder e não poderá escolher o seu sucessor”. Finalmente, a 1 de Março, o porta-voz de Boris Johnson disse que as sanções contra a Rússia “que estamos a introduzir, que grandes partes do mundo estão a introduzir, são para derrubar o regime de Putin”.
Estas declarações reflectem a estratégia de longa data dos EUA para a mudança de regime em Moscovo, tendo a Ucrânia como pivô. Por um lado, enviar suficiente equipamento militar e outro à Ucrânia para afundar num pântano os militares russos. Por outro lado, impor sanções severas e de longo alcance à Rússia, de modo a causar grandes perturbações à elite russa e uma grande contracção das condições de vida da classe média russa. A combinação deveria durar o tempo suficiente para os russos se levantarem para derrubar Putin e instalar um Presidente tipo Ieltsin, mais simpático ao Ocidente.
Mas esta estratégia de armas-mais-sanções precisava de uma causa. A invasão de Putin foi o casus belli necessário. De modo algum desculpa a invasão da Rússia e as suas tácticas desprezíveis dizer que o Kremlin caiu numa armadilha dos EUA e da NATO.
Duas mega forças em confronto
Os nossos meios de comunicação social “livres” tenderam a cingir-se à narrativa de um “malvado e revanchista Putin” atacando “a inocente e unificada Ucrânia, como um primeiro passo para a conquista de outras partes da Europa Central e Oriental e para a restauração da antiga União Soviética”.
A crise da Ucrânia expressa o choque de duas mega-forças moldanado a ordem mundial. Uma é a afirmação de longa data dos EUA de “primazia” ou “hegemonia” em relação a todos os outros Estados. Os Presidentes Putin e Xi (assim como muitos no Ocidente) falam frequente e com agrado do declínio dos EUA e da fractura do Ocidente, especialmente desde a crise financeira do Atlântico Norte de 2008. No entanto o que é surpreendente na resposta dos EUA e do Ocidente à invasão da Rússia é a forma como os EUA têm mobilizado outros estados ocidentais - e muito importante, as empresas multinacionais ocidentais - para isolar um estado proeminente do G20 e antigo membro do G8.
A outra mega força em confronto é a ambição do Estado russo de se constituir como o centro da política, cultura e economia euro-asiática. Este impulso de longo prazo é incompreendido pelo enfoque em Putin - a sua ambição e o seu estado de espírito. Jane Burbank, professora emeritus de História e estudos russos e eslavos na Universidade de Nova Iorque, lembra-nos: “Desde os anos 90, planos para reunir a Ucrânia e outros estados pós-soviéticos numa superpotência transcontinental têm vindo a fermentar na Rússia. Uma teoria revitalizada do império eurasiático informa cada movimento do Sr. Putin”.
De facto, desde o colapso do império russo em 1917, uma linha de pensadores russos tem desenvolvido uma ideologia do eurasianismo. Foi suprimida durante o período soviético, mas eclodiu durante a perestroika no final dos anos 80. A ideologia coloca não só a América, mas todo o mundo atlântico como o adversário da Rússia no “choque de civilizações”, com a ortodoxia russa aproveitada como a cola na guerra geopolítica que se avizinha. Sob Putin, os temas da glória imperial e da vitimização ocidental foram elevados ao centro das atenções em todo o país.
Como Burbank explica, a Ucrânia figurava nesta ideologia eurasiática como um obstáculo desde o início. Os ideólogos eurasianos dos anos 20 já falavam do “problema da Ucrânia”, apresentando a Ucrânia como excessivamente “individualista” e insuficientemente ortodoxa. Ideólogos proeminentes dos anos 90 identificavam a soberania ucraniana como, nas palavras de um deles, um “enorme perigo para toda a Eurásia”. O projecto russo da Eurásia, disse, exigia, como “imperativo absoluto”, o controlo total de toda a costa norte do Mar Negro. A Ucrânia tinha de se tornar “um sector puramente administrativo do Estado centralizado russo”.
Esta é a ideologia que motivou Putin, que o levou a declarar a Ucrânia como “uma colónia com um regime fantoche” na véspera da invasão. Esta é a ideologia que inspira e justifica a seus olhos a sua guerra brutal.
A estratégia dos EUA e da OTAN
Tendo sintetizado a ambição de Putin e do Estado russo, voltamos à estratégia dos EUA e da NATO para a Ucrânia e a Rússia. Baseio-me num esclarecedor ensaio de Joe Lauria, que expõe os motivos ulteriores dos EUA e da NATO na crise da Ucrânia: acabar com o regime de Putin e substituí-lo por um amigo e subordinado dos EUA.
A estratégia dos EUA para a mudança de regime em Moscovo está há muito em preparação. Em 2013 (antes do Presidente Yanukovych da Ucrânia ser derrubado em 2014), Carl Gershman, Director do National Endowment for Democracy (NED), escreveu: “A Ucrânia é o maior prémio”. Explicou que se ela pudesse ser afastada da Rússia e voltada para o Ocidente, “Putin pode encontrar-se no extremo perdedor não só no estrangeiro visinho, mas dentro da própria Rússia”.
Esta estratégia ampla para conter a Rússia é o contexto para compreender a expansão dos membros da NATO ao longo das fronteiras da Rússia, desde o Báltico até à Bulgária, e a presença de 30.000 tropas Nato-atribuídas. Também ajuda a compreender a intervenção militar dos EUA e de alguns outros estados ocidentais para derrubar o governante da Síria, Bashar al-Assad, aliado da Rússia, bem como a política de encorajar as ONG norte-americanas a fomentar agitação na Rússia.
Desde 2015, a CIA tem vindo a supervisionar um programa secreto de treino intensivo nos EUA para as forças de operações especiais de elite ucranianas e outro pessoal dos serviços secretos. A 13 de Janeiro, foi noticiado que as forças formadas pela CIA “poderiam em breve desempenhar um papel crítico na fronteira oriental da Ucrânia, onde as tropas russas se concentraram no que muitos temem ser a preparação para uma invasão”. Um antigo oficial da CIA explicou: “Os Estados Unidos estão a treinar uma insurreição”. Não é surpresa que Moscovo tenha há muito lido as acções dos EUA e da NATO como sendo profundamente hostis e destinadas a produzir uma “mudança de regime” no Kremlin.
A contagem decrescente para a invasão da Rússia
Em 2014, o presidente democraticamente eleito Yanukovych - explicitamente amigo tanto da UE como de Moscovo - foi derrubado num golpe (com substancial apoio dos EUA). A 23 de Fevereiro, no dia seguinte à fuga de Yanukovych, o primeiro acto do parlamento ucraniano foi revogar o estatuto legal do russo como língua nacional; e, mais amplamente, impedir as regiões de permitirem a utilização de qualquer outra língua que não o ucraniano. O governo decidiu bloquear o acesso a notícias, canais de televisão e rádio russos. Ao longo dos meses seguintes, o governo, os meios de comunicação social e largos sectores da população cantaram o lema “Uma Nação, Uma Língua, Um Povo”.
Estes foram actos flagrantemente beligerantes em relação a uma grande minoria. É fácil de compreender porque é que os muitos milhões de falantes de russo se sentiram sob um cerco envenenado; e porque se sentiram encorajados pelo apoio do poderoso Estado à sua porta. O facto de a legislação linguística não ter sido então posta em vigor não “fez com que tudo voltasse de repente a ficar bem”. Os esforços para marginalizar os falantes de russo continuaram.
As populações das províncias orientais de Donetsk e Luhansk em grande parte falantes de russo e crentes ortodoxos votaram a favor da independência em relação à Ucrânia. O governo de Kyiv (maioritariamente ucraniano e católico) lançou uma guerra contra estas províncias para esmagar a sua resistência.
Avançemos até Dezembro de 2021. O Kremlin apresentou propostas de tratado, que incluíam a implementação dos acordos de paz de Minsk já com oito anos de idade (que incluem um compromisso de não adesão da Ucrânia à NATO); a dissolução das milícias ucranianas de extrema-direita; e o envolvimento em negociações sérias sobre uma nova arquitectura de segurança na Europa. Os EUA e a NATO recusaram-se consistentemente a negociar. E ao recusar, avisaram também o mundo, a partir de Dezembro de 2021, de que a Rússia iria invadir. E transferiram enormes quantidades de armas e treinaram os militares ucranianos.
A 19 de Fevereiro, o Presidente Zelensky fez um apaixonado discurso na Conferência de Segurança de Munique, insistindo que a Ucrânia deve ter um caminho aberto para se juntar à NATO, e lamentando que a Ucrânia tivesse desistido do seu arsenal nuclear no final da União Soviética, então o terceiro maior do mundo. Na terceira semana de Fevereiro, os militares ucranianos aumentaram dramaticamente os seus bombardeamentos das províncias de Donetsk e Luhansk, como relatado pelos observadores da OSCE como foi relatado por observadores da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa). É provável que este aumento no ataque ucraniano tenha tido a bênção dos EUA e da NATO.
Até este ponto, o Kremlin não tinha reconhecido as duas repúblicas de Donbass; tinha-se aguentado durante oito anos. Agora, à medida que os militares ucranianos intensificavam o seu ataque, o Kremlin tinha de decidir. Entrou na guerra civil em curso a fim de proteger as repúblicas Donbass dos intensificados ataques militares ucranianos, e numa escala suficientemente grande para que pudesse substituir o governo nacional.
A armadilha colocada pelos EUA
Parece agora que o Kremlin caiu numa armadilha (e dizer isto não é - repito - uma tentativa de desculpar as acções da Rússia). A armadilha tem semelhanças com a armadilha que os EUA montaram a Saddam Hussein em 1990, quando afirmaram que não ir interferir na disputa do seu governo com o Kuwait. Saddam invadiu o Kuwait, o que deu aos EUA o casus belli para destruir as forças armadas iraquianas.
A armadilha também tem semelhanças com uma que a CIA colocou a Moscovo há quatro décadas, ao armar os mujahideen para combater o governo apoiado pelos soviéticos no Afeganistão. Os EUA pretendiam que Moscovo enviasse os seus militares para defender o governo, o que fez em 1979. O conselheiro de segurança nacional do Presidente Carter, Zbigniew Brzezinski, numa entrevista em 1998 ao Le Nouvel Observateur, admitiu alegremente que os EUA tinham armado uma armadilha:
Efectivamente, foi a 3 de Julho de 1979 que o Presidente Carter assinou a primeira directiva de ajuda secreta aos opositores do regime pró-soviético em Cabul. E nesse mesmo dia, escrevi uma nota ao presidente em que expliquei que, na minha opinião, esta ajuda iria induzir uma intervenção militar soviética… Essa operação secreta foi uma excelente Ideia. Tinha o efeito de atrair os russos para a armadilha afegã [registe a sua fraseI e queria que o lamentasse? No dia em que os soviéticos atravessaram oficialmente a fronteira, escrevi ao Presidente Carter, essencialmente: “ temos agora a oportunidade de dar à URSS a sua guerra do Vietname”. De facto, durante quase 10 teve que prosseguir uma Guerra que era insustentável para o regime, um conflito que trouxe desmoralização e, finalmente, a desagregação do império soviético.
Brzezinski presumiu, tal como fazem hoje os EUA, que o controlo da Eurásia é vital para a “primazia” ou “hegemonia” dos EUA no sistema mundial (contrariando directamente a ideologia eurasiática da Rússia). No seu livro de 1997: The Grand Chessboard: American Primacy and Its Geopolitical Imperatives escreveu: “A Ucrânia, um novo e importante espaço no tabuleiro de xadrez eurasiático, é um pivô geopolítico porque a sua própria existência como país independente ajuda a transformar a Rússia”.
Explicou que sem que a Ucrânia fosse integrada ou aliada próxima da Rússia, a Rússia era um “Estado imperial predominantemente asiático”. Enquanto que a Ucrânia integrada na Rússia deu à Rússia a abertura para ser (ou voltar a ser) “um império eurasiático”. Assim, o objectivo de longa data dos EUA tem sido o de afastar a Ucrânia da Rússia, como um passo importante no sentido de restringir a estratégia russa, e mais distantemente também a estratégia chinesa, sustentando assim a primazia dos EUA.
Parece provável que os estrategas dos EUA e da NATO tenham em mente uma segunda armadilha para a Ucrânia. A primeira foi a invasão; a segunda é a Rússia atolada numa outra longa insurgência, a segunda depois do Afeganistão, o segundo “Vietname” russo. Como a insurreição do Afeganistão contra os militares soviéticos ajudou a derrubar a União Soviética, os estrategas ocidentais esperam que a insurreição ucraniana contra militares russos atolados ajude a pôr fim ao regime de Putin. Do ponto de vista dos EUA, quanto mais tempo os ucranianos conseguirem sustentar a insurgência e manter os militares russos atolados, mais provável será o fim do regime de Putin. A isto chama-se “política realista”!
Neste contexto, podemos compreender porque é que um general russo sénior reformado (Leonid Ivashov) avisou numa carta aberta pouco antes da invasão que um ataque seria “inútil e extremamente perigoso” e ameaçaria a existência da Rússia. O Financial Times cita um analista militar baseado em Moscovo, Pavel Luzin, como dizendo que o Kremlin “não deu ouvidos aos militares - eles ouviram [oficiais dos serviços secretos] que disseram que podemos rapidamente levar a cabo esta operação especial “.
A estratégia de sanções
A estratégia do pântano ou Vietname é complementada pela estratégia de sanções - as sanções mais duras que os EUA e a Europa alguma vez impuseram a qualquer nação. Como referido, mesmo para aqueles cépticos de afirmações do “fim do império Americano”, é espantosa a eficácia com que os EUA mobilizara nações ocidentais em torno de um projecto de isolamento de uma das maiores economias mundiais, uma das duas maiores potências nucleares, e o maior fornecedor de energia à Europa, como se se tratasse da Coreia do Norte.
A lista é impressionante. As sanções mais prejudiciais são as sobre o banco central russo, que estão a conseguir martelar o valor do rublo (de 85 rublos para o dólar americano em 24 de Fevereiro, dia da invasão, para 154 para o dólar em 7 de Março, de volta para 101 em 25 de Março).
A maioria das transacções russas já não podem ser liquidadas através do sistema de pagamento internacional SWIFT, o que significa que a maioria das transacções internacionais russas já não são permitidas. Os maiores bancos russos são sancionados. O já fisicamente concluído gasoduto germano-russo Nord Stream 2 foi encerrado e a sua empresa faliu. Os EUA proibiram as importações de petróleo russo. A BP e a Shell retiraram-se das suas parcerias com a Rússia.
As exportações russas de trigo e fertilizantes foram proibidas, fazendo subir o preço dos alimentos no Ocidente. O espaço aéreo europeu e norte-americano está fechado aos aviões russos. Putin e muitos líderes russos foram pessoalmente sancionados. PayPal, Facebook, Twitter, Netflix, McDonalds, e Coca-Cola foram encerrados na Rússia. E os fornecedores de cabo dos EUA conseguiram que a RT (Russia Today) América fosse encerrada.
O Ministro dos Negócios Estrangeiros francês Jean-Yves Le Drian explicou que o objectivo é “asfixiar a economia da Rússia”, mesmo que o Ocidente seja prejudicado no processo. Os prejuízos para o Ocidente são um preço que vale a pena pagar pela mudança de regime em Moscovo, com novos líderes respeitadores da primazia dos EUA.
Mas após apenas um mês da invasão, os pesados custos da estratégia dos EUA e da NATO para si próprios estão a tornar-se demasiado claros. À medida que o pântano se arrasta, os efeitos da ruptura económica com a Rússia começam a fazer-se sentir de forma aguda na Europa sob a forma de aumento dos preços, escassez de energia, perda de empregos, absorção de muitos milhões de refugiados ucranianos, e em breve se aproximam da absorção de ainda mais refugiados de países famintos de alimentos que anteriormente dependiam de cereais e fertilizantes ucranianos e russos. Os custos são significativos mesmo nos EUA, onde a inflação já é elevada e as taxas de aprovação do Presidente Biden são baixas. Em algum momento, os EUA e outras nações ocidentais irão ter que recuar no objectivo da mudança de regime, para se salvarem a si próprios.
Mas os objectivos dos EUA e da NATO são ainda mais complicados do que a mudança de regime de Moscovo e a manutenção de custos toleráveis para si próprios. O objectivo de assegurar um regime russo respeitador da primazia dos EUA e da NATO está entrelaçado como uma dupla hélice com o objectivo de manter a Rússia como um inimigo externo, a fim de fornecer cola para a cooperação entre os estados membros do Ocidente, frequentemente fraccionais, sob a liderança dos EUA.
Para justificar a liderança dos EUA, para apresentar uma frente unitária na NATO, e para justificar grandes aumentos nos orçamentos militares ocidentais (especialmente alemães), a Rússia deve ser apresentada como o inimigo comum. As empresas militares ocidentais também têm uma forte procura para que o Ocidente acredite que enfrenta inimigos existenciais sob a forma de grandes Estados (e não apenas escorregadios “terroristas” ou “um bando de anões”, como o Presidente do Estado-Maior Conjunto, General Martin Dempsey, rotulou o Estado islâmico). De facto, os preços das acções dos principais fabricantes de armas dos Estados Unidos disparava em direcção ao céu à medida que a invasão russa parecia provável.
O ponto-chave foi focado por Georgy Arbatov, cientista político e conselheiro de Mikhail Gorbachev (e outros secretários do Partido Comunista), e fundador e director do Instituto de Estudos dos EUA e do Canadá na Academia Russa de Ciências. Disse em 1987 a um grupo de altos funcionários norte-americanos: “Vamos fazer-vos uma coisa terrível - vamos privar-vos de um inimigo”.
É desta forma que se pode compreender a persistente recusa do Ocidente face aos esforços de Gorbachev, Boris Ieltsin e o Putin inicial para estabelecer relações não conflituosas com os estados ocidentais. Precisa da Rússia como inimigo para proporcionar unidade interna. Mas, por outro lado, também precisa da Rússia como parceiro de cooperação mostrando uma deferência adequada ao Ocidente, especialmente no decurso das próximas décadas, à medida que a China se torna mais forte.
Entretanto, a China está a observar a crise da Ucrânia e a estratégia dos EUA e da NATO, e provavelmente a recalcular a sua confiança no declínio do Ocidente. Este novo cálculo pode levar Pequim a estabelecer laços mais estreitos com Moscovo - enquanto Pequim também quer certificar-se de que não ajuda o Kremlin a ponto de a Rússia poder desafiar o seu próprio objectivo de dominar a massa terrestre eurasiática, o qual está bem encaminhado sob a forma de alianças de infra-estruturas criadas pela gigantesca Iniciativa Cinturão e Estrada.
Explicou que sem que a Ucrânia fosse integrada ou aliada próxima da Rússia, a Rússia era um “Estado imperial predominantemente asiático”. Enquanto que a Ucrânia integrada na Rússia deu à Rússia a abertura para ser (ou voltar a ser) “um império eurasiático”. Assim, o objectivo de longa data dos EUA tem sido o de afastar a Ucrânia da Rússia, como um passo importante no sentido de restringir a estratégia russa, e mais distantemente também a estratégia chinesa, sustentando assim a primazia dos EUA.
Parece provável que os estrategas dos EUA e da NATO tenham em mente uma segunda armadilha para a Ucrânia. A primeira foi a invasão; a segunda é a Rússia atolada numa outra longa insurgência, a segunda depois do Afeganistão, o segundo “Vietname” russo. Como a insurreição do Afeganistão contra os militares soviéticos ajudou a derrubar a União Soviética, os estrategas ocidentais esperam que a insurreição ucraniana contra militares russos atolados ajude a pôr fim ao regime de Putin. Do ponto de vista dos EUA, quanto mais tempo os ucranianos conseguirem sustentar a insurgência e manter os militares russos atolados, mais provável será o fim do regime de Putin. A isto chama-se “política realista”!
Neste contexto, podemos compreender porque é que um general russo sénior reformado (Leonid Ivashov) avisou numa carta aberta pouco antes da invasão que um ataque seria “inútil e extremamente perigoso” e ameaçaria a existência da Rússia. O Financial Times cita um analista militar baseado em Moscovo, Pavel Luzin, como dizendo que o Kremlin “não deu ouvidos aos militares - eles ouviram [oficiais dos serviços secretos] que disseram que podemos rapidamente levar a cabo esta operação especial “.
A estratégia de sanções
A estratégia do pântano ou Vietname é complementada pela estratégia de sanções - as sanções mais duras que os EUA e a Europa alguma vez impuseram a qualquer nação. Como referido, mesmo para aqueles cépticos de afirmações do “fim do império Americano”, é espantosa a eficácia com que os EUA mobilizara nações ocidentais em torno de um projecto de isolamento de uma das maiores economias mundiais, uma das duas maiores potências nucleares, e o maior fornecedor de energia à Europa, como se se tratasse da Coreia do Norte.
A lista é impressionante. As sanções mais prejudiciais são as sobre o banco central russo, que estão a conseguir martelar o valor do rublo (de 85 rublos para o dólar americano em 24 de Fevereiro, dia da invasão, para 154 para o dólar em 7 de Março, de volta para 101 em 25 de Março).
A maioria das transacções russas já não podem ser liquidadas através do sistema de pagamento internacional SWIFT, o que significa que a maioria das transacções internacionais russas já não são permitidas. Os maiores bancos russos são sancionados. O já fisicamente concluído gasoduto germano-russo Nord Stream 2 foi encerrado e a sua empresa faliu. Os EUA proibiram as importações de petróleo russo. A BP e a Shell retiraram-se das suas parcerias com a Rússia.
As exportações russas de trigo e fertilizantes foram proibidas, fazendo subir o preço dos alimentos no Ocidente. O espaço aéreo europeu e norte-americano está fechado aos aviões russos. Putin e muitos líderes russos foram pessoalmente sancionados. PayPal, Facebook, Twitter, Netflix, McDonalds, e Coca-Cola foram encerrados na Rússia. E os fornecedores de cabo dos EUA conseguiram que a RT (Russia Today) América fosse encerrada.
O Ministro dos Negócios Estrangeiros francês Jean-Yves Le Drian explicou que o objectivo é “asfixiar a economia da Rússia”, mesmo que o Ocidente seja prejudicado no processo. Os prejuízos para o Ocidente são um preço que vale a pena pagar pela mudança de regime em Moscovo, com novos líderes respeitadores da primazia dos EUA.
Mas após apenas um mês da invasão, os pesados custos da estratégia dos EUA e da NATO para si próprios estão a tornar-se demasiado claros. À medida que o pântano se arrasta, os efeitos da ruptura económica com a Rússia começam a fazer-se sentir de forma aguda na Europa sob a forma de aumento dos preços, escassez de energia, perda de empregos, absorção de muitos milhões de refugiados ucranianos, e em breve se aproximam da absorção de ainda mais refugiados de países famintos de alimentos que anteriormente dependiam de cereais e fertilizantes ucranianos e russos. Os custos são significativos mesmo nos EUA, onde a inflação já é elevada e as taxas de aprovação do Presidente Biden são baixas. Em algum momento, os EUA e outras nações ocidentais irão ter que recuar no objectivo da mudança de regime, para se salvarem a si próprios.
Mas os objectivos dos EUA e da NATO são ainda mais complicados do que a mudança de regime de Moscovo e a manutenção de custos toleráveis para si próprios. O objectivo de assegurar um regime russo respeitador da primazia dos EUA e da NATO está entrelaçado como uma dupla hélice com o objectivo de manter a Rússia como um inimigo externo, a fim de fornecer cola para a cooperação entre os estados membros do Ocidente, frequentemente fraccionais, sob a liderança dos EUA.
Para justificar a liderança dos EUA, para apresentar uma frente unitária na NATO, e para justificar grandes aumentos nos orçamentos militares ocidentais (especialmente alemães), a Rússia deve ser apresentada como o inimigo comum. As empresas militares ocidentais também têm uma forte procura para que o Ocidente acredite que enfrenta inimigos existenciais sob a forma de grandes Estados (e não apenas escorregadios “terroristas” ou “um bando de anões”, como o Presidente do Estado-Maior Conjunto, General Martin Dempsey, rotulou o Estado islâmico). De facto, os preços das acções dos principais fabricantes de armas dos Estados Unidos disparava em direcção ao céu à medida que a invasão russa parecia provável.
O ponto-chave foi focado por Georgy Arbatov, cientista político e conselheiro de Mikhail Gorbachev (e outros secretários do Partido Comunista), e fundador e director do Instituto de Estudos dos EUA e do Canadá na Academia Russa de Ciências. Disse em 1987 a um grupo de altos funcionários norte-americanos: “Vamos fazer-vos uma coisa terrível - vamos privar-vos de um inimigo”.
É desta forma que se pode compreender a persistente recusa do Ocidente face aos esforços de Gorbachev, Boris Ieltsin e o Putin inicial para estabelecer relações não conflituosas com os estados ocidentais. Precisa da Rússia como inimigo para proporcionar unidade interna. Mas, por outro lado, também precisa da Rússia como parceiro de cooperação mostrando uma deferência adequada ao Ocidente, especialmente no decurso das próximas décadas, à medida que a China se torna mais forte.
Entretanto, a China está a observar a crise da Ucrânia e a estratégia dos EUA e da NATO, e provavelmente a recalcular a sua confiança no declínio do Ocidente. Este novo cálculo pode levar Pequim a estabelecer laços mais estreitos com Moscovo - enquanto Pequim também quer certificar-se de que não ajuda o Kremlin a ponto de a Rússia poder desafiar o seu próprio objectivo de dominar a massa terrestre eurasiática, o qual está bem encaminhado sob a forma de alianças de infra-estruturas criadas pela gigantesca Iniciativa Cinturão e Estrada.
Sobre o autor
Robert H. Wade é Professor de Economia Política Global na London School of Economics.
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