1 de fevereiro de 2020

Marx e os Indígenas

John Bellamy Foster, Brett Clark e Hannah Holleman



Tradução / A “virada em direção aos indígenas” na teoria social nas últimas duas décadas, associada à crítica do colonialismo de povoamento [settler colonialism], reintroduziu temas há muito presentes na teoria marxista, mas de maneiras que muitas vezes são surpreendentemente divorciadas da crítica de Karl Marx ao capitalismo, ao colonialismo e ao imperialismo.1 Parte da razão para essa desconexão é que as discussões atuais sobre o colonialismo de povoamento evoluíram de tradições na teoria cultural pós-moderna e pós-colonial que estão distantes do materialismo histórico.2 No entanto, uma explicação mais profunda para o abismo entre o trabalho acadêmico atual sobre o colonialismo de povoamento e o marxismo está associado às afirmações de alguns críticos de esquerda de que o trabalho de Marx é caracterizado pelo seguinte: (1) um desenvolvimentismo bruto e determinismo econômico; (2) uma postura pró-colonialista; (3) uma concepção teleológica de progresso; e (4) prometeanismo ou produtivismo extremo em relação ao meio ambiente.3 Tais acusações são frequentemente empregadas para considerar o materialismo histórico irrelevante ou mesmo hostil às lutas e perspectivas indígenas contemporâneas.

Em Red Skin, White Masks [Pele Vermelha, Máscaras Brancas, sem tradução para o português], Glen Sean Coulthard fornece uma visão com diferentes nuances de Marx e dos indígenas, envolvendo a crítica deste último à “chamada acumulação primitiva”. Coulthard insiste que a “estrutura teórica de Marx” a esse respeito pode ser vista como extremamente “relevante para uma compreensão abrangente do colonialismo de povoamento e da resistência indígena”, mas que isso requer que o materialismo histórico clássico “seja transformado em conversação com o pensamento e as práticas críticas dos próprios povos indígenas. ” Especificamente, ele procura transcender o que ele considera serem as visões equivocadas de Marx (1) que tal expropriação está confinada aos estágios de formação do capitalismo, ao invés de constituir um processo contínuo; (2) que existe uma lógica desenvolvimentista unilinear a ser equiparada ao progresso; e (3) que o meio ambiente deve ser tratado como uma dádiva gratuita, de modo que a terra não seja vista como explorada, mas apenas as pessoas.4

Levando essas críticas a sério, voltamos aos fundamentos clássicos da teoria marxiana para determinar onde a análise deu errado — se é que deu errado -, o que pode ser derivado dela de forma útil e como construir (ou reconstruir) uma crítica marxiana do colonialismo relevante às lutas contemporâneas. Acreditamos que, por meio dessa avaliação, os pontos fortes do argumento histórico-materialista clássico se tornarão evidentes.

Retornar a Marx como ponto de partida é crucial para desenvolver uma crítica materialista do capitalismo e do colonialismo. No entanto, não existe no materialismo histórico uma ortodoxia fixa. Em vez disso, o marxismo, desde o início, foi moldado por tradições revolucionárias vernaculares. Como uma filosofia da práxis voltada não apenas para compreender o mundo, mas também para mudá-lo, o materialismo histórico menos do que qualquer coisa pode se dar ao luxo de ser supra-histórico ou negligenciar as lições das lutas nacionais e populares.5 “Ortodoxia” no marxismo, nas palavras célebres de Georg Lukács, “refere-se exclusivamente ao método”.6 É, portanto, o método materialista, histórico e dialético do marxismo clássico que constitui hoje o ponto de partida necessário para se engajar na crítica do colonialismo, incluindo o colonialismo de povoamento.

Colonialismo e Expropriação

Coulthard afirma em Red Skin, White Masks que a teoria de Marx da expropriação como uma condição histórica do desenvolvimento capitalista ocupa-se principalmente da “separação perpétua dos trabalhadores dos meios de produção” e não com a relação colonial em si. Da mesma forma, somos informados de que a discussão de Marx sobre “A Teoria Moderna do Colonialismo” no capítulo final do volume 1 d’O Capital foi dedicada simplesmente a estabelecer sua teoria do trabalho assalariado e do capital, apontando para a necessidade de o capital remover os trabalhadores da terra, indicando uma total falta de preocupação com o colonialismo. Com base nessas críticas, Coulthard sugere que a crítica deve mudar de um foco principalmente na relação capital para outro que também destaque a relação colonial, superando assim a unilateralidade de Marx a esse respeito.7

No entanto, no capítulo 31 d’O Capital, “Gênese do Capitalista Industrial”, Marx já aponta para a necessidade de considerar a relação colonial como subjacente à relação do capital. Na verdade, ele é absolutamente claro quanto a este assunto:

A descoberta de ouro e prata na América, a extirpação, escravização e sepultamento em minas da população indígena daquele continente, o início da conquista e pilhagem da Índia e a conversão da África em uma reserva para a caça comercial de peles negras, são todas as coisas que caracterizam o início da era da produção capitalista. Esses procedimentos idílicos são os principais momentos da acumulação primitiva.8

Consequentemente, para Marx, não são os vários cercamentos dos comuns na Inglaterra, discutidos nos primeiros capítulos da parte VIII d’O Capital sobre “A assim chamada acumulação primitiva”, que constituíram os principais momentos de expropriação primária e a gênese do capitalista industrial, mas sim a pilhagem de todo o mundo fora da Europa, centrando-se na “extirpação, escravização e sepultamento em minas da população indígena”, englobando o roubo dos metais preciosos, das terras e dos corpos dos indígenas.9 Além disso, as colônias de povoamento de brancos ingleses recebem críticas específicas pelos horrores que infligiram:

O tratamento dispensado à população indígena teve, é claro, a sua versão mais assustadora em colônias com o sistema de plantation estabelecidas exclusivamente para o comércio de exportação, como as Índias Ocidentais, e em países ricos e bem populosos, como México e Índia, que eram entregues à pilhagem. Mas mesmo nas colônias propriamente ditas [ou colônias de povoamento — em espanhol, colono/a significa colono (nota da tradução: aqui, os autores explicam a correspondência entre a palavra settler do inglês e colono/a do Espanhol. No entanto, ao traduzirmos o inglês para português, o comentário se torna confuso em função da igualdade dos termos em espanhol e português)], o caráter cristão da acumulação primitiva não foi ocultado. Em 1703, aqueles expoentes moderados do protestantismo, os puritanos da Nova Inglaterra, por decretos de sua assembléia, estabeleceram uma recompensa de £40 por escalpo indígena e pele vermelha capturado; em 1720, uma recompensa de £100 foi estabelecida por escalpo; em 1744, depois de Massachusetts Bay ter proclamado uma certa tribo como rebelde, os seguintes preços foram estabelecidos: para um escalpo masculino de 12 anos ou mais, £100 em nova moeda; para um prisioneiro do sexo masculino, £105; para mulheres e crianças prisioneiras, £50; para o escalpo de mulheres e crianças, £50. Algumas décadas depois, o sistema colonial vingou-se dos descendentes dos piedosos patriarcas puritanos [pilgrim fathers], que haviam entretanto se tornado subversivos. Por instigação inglesa, e por dinheiro inglês, foram mortos a machadadas pelos peles-vermelhas. O Parlamento britânico proclamou cães de caça e escalpelamento como os “meios que Deus e a natureza entregaram em suas mãos”.10

Marx não deixou de notar que o preço do escalpo era equivalente ao preço dos prisioneiros, o que significa que o genocídio, e não a escravidão, era o objetivo. Desta forma, Marx destacou que o objetivo principal nas colônias de povoamento inglesas na América do Norte era a “extirpação” absoluta da população indígena. De fato, como William Howitt explicou em Colonization and Christianity: A Popular History of the Treatment of the Natives by the Europeans in All Their Colonies [Colonização e Cristianismo: Uma História Popular do Tratamento dos Nativos pelos Europeus em Todas as Suas Colônias] (1838), que Marx estudou pela primeira vez em 1851, o colonialismo de povoamento branco nos Estados Unidos que estavam nascendo visava o extermínio e remoção das tribos nativas americanas. Aqui, Howitt citou a declaração de Abbé Raynal de que o objetivo dos ingleses e franceses era “extirpar” os nativos americanos.11 Howitt também descreveu “as campanhas de extermínio do general Jackson”, citando a declaração de Andrew Jackson em 27 de março de 1814, durante sua campanha militar contra as tribos do sul, de que ele estava “determinado a exterminá-los.” Os povos nativos americanos, observou Howitt, “foram levados à ruína ou à aniquilação”. Escrevendo na época da Trilha das Lágrimas e da remoção em massa dos nativos americanos do Sudeste, Howitt concluiu com as seguintes palavras:

Nada será capaz de impedir a expatriação final dessas tribos do sul: elas devem passar pelo Mississippi até que a população branca cresça o suficiente para obrigá-las a cruzar o Missouri; então restarão apenas duas barreiras entre elas e a aniquilação — as montanhas rochosas e o oceano Pacífico. Sempre que ouvimos falar dessas tribos atualmente, é sobre algum novo ato de agressão contra elas — alguma nova expulsão de parte delas — e sobre índios melancólicos que se dirigem para as selvas ocidentais.12

Durante o tempo em que ele estava escrevendo O Capital, o livro de Howitt foi a principal fonte de Marx sobre o tratamento colonial não apenas dos nativos americanos, mas das populações indígenas em todo o mundo. No entanto, ao mesmo tempo em que encontrou Howitt, Marx também estudou History of the Conquest of Mexico [História da Conquista do México] (1843) e History of the Conquest of Peru [História da Conquista do Peru] (1847), de William Prescott, e The African Slave Trade and Its Remedy [O tráfico de escravos africanos e seu remédio] (1840), de Thomas Fowell Buxton, além de vários trabalhos sobre a Índia.13 Na década de 1850, ele examinou de perto as Lectures on Colonization and Colonies [Lições sobre Colonização e Colônias] (1841) de Herman Merivale.14 Em 1853, ele leu History of Java [História de Java] (1817), de Thomas Stamford Raffles, na qual Howitt também havia confiado para sua abordagem de Java.15 Isso foi seguido por estudos de numerosos trabalhos adicionais sobre escravidão, mencionados em O Capital.

Colonization and Christianity de Howitt tinha mais de quinhentas páginas e incluía capítulos separados sobre o tratamento dos indígenas por potências coloniais em várias regiões do mundo, com doze capítulos dedicados a como espanhóis e portugueses se comportavam em relação às populações nativas no Novo Mundo, três sobre colonos ingleses e os indígenas na América do Norte, dois sobre “O Tratamento dos Índios nos Estados Unidos”, cinco sobre os ingleses na Índia, um sobre os ingleses na colônia do Cabo na África do Sul, um sobre os holandeses na Índia e Indonésia (Java) e outro sobre os holandeses na Austrália e nas ilhas do Pacífico, e um sobre os franceses em suas colônias. No conjunto, Colonization and Christianity foi o maior compêndio sobre as atrocidades globais do colonialismo escrito em sua época, contendo detalhes abundantes, muitas vezes contando com relatórios comerciais e governamentais. Como escreveu Marx: “W. Howitt, um homem que se especializou em ser cristão, diz sobre o sistema colonial cristão: ‘As barbáries e os ultrajes desesperados da chamada raça cristã, em todas as regiões do mundo e sobre todos os povos que eles conseguiram subjugar, não podem ser comparados com aqueles de qualquer outra raça, por mais ferozes, por mais sem instrução e por mais indiferentes à misericórdia e à vergonha que sejam, em qualquer época da Terra.’”16

Dado que Marx estava preocupado com o papel que a expropriação colonial de terras e povos indígenas desempenhou na gênese do capitalista industrial, ele focou sua abordagem principalmente nos holandeses e ingleses, sendo esses os dois países que lideraram o desenvolvimento do capitalismo industrial. A respeito dos holandeses, Marx observou que em 1648, no apogeu de seu poder, a Holanda tinha o controle quase total do comércio das Índias Orientais. N’O Capital, ele se concentrou particularmente no papel holandês em Java, conforme detalhado em History de Raffles (extraindo, no entanto, principalmente de passagens que foram destacadas em Colonization and Christianity de Howitt). Aqui, o papel de “ladrões de homens” organizados, consistindo em “o ladrão, o intérprete e o vendedor”, todos sistematicamente envolvidos em “roubar homens” que foram então acorrentados à força, escondidos em prisões secretas e arrastados para navios negreiros que aguardavam, foi cuidadosamente retratado. Como observou Marx, “Banjuwangi, uma província de Java, tinha mais de 80.000 habitantes em 1750 e apenas 18.000 em 1811. Isso”, exclamou ele com amarga ironia, “é comércio pacífico!”. Com base em sua expropriação colonial, argumentou Marx, o “capital total” da República Holandesa cresceu a tal ponto, em meados do século XVII, que provavelmente ultrapassou o de todo o resto da Europa junto.17

Mas a barbárie colonial do capitalismo holandês seria superada em escala nos séculos XVIII e XIX pelos ingleses. Marx, seguindo Howitt, explicou que o governador britânico da Companhia das Índias Orientais insistia em seu “monopólio exclusivo” no comércio de chá, bem como no comércio com a China e a Europa. Mas os funcionários favorecidos da Companhia foram capazes de controlar os monopólios de sal, ópio, bétel e outras mercadorias, dominando o comércio costeiro. “Grandes fortunas surgiram como cogumelos em um dia”, tendo como base algumas das formas mais cruéis de expropriação do período.18 Confiando em Howitt como sua fonte, Marx escreveu: “Entre 1769 e 1770, os ingleses criaram fome comprando todo o arroz e se recusando a vendê-lo novamente, exceto a preços fabulosos.”19 Em uma nota de rodapé, ele acrescentou:“ No ano de 1866 mais de um milhão de hindus morreram de fome só na província de Orissa. No entanto, tentou-se enriquecer o tesouro [colonial] indiano com o preço a que os meios de subsistência eram vendidos aos famintos.”20

A pilhagem foi enorme. “Os tesouros capturados fora da Europa por pilhagem, escravidão e assassinato sem disfarces”, escreveu Marx, “fluíram de volta para a pátria-mãe”. O sistema colonial “proclamou a obtenção de lucro como o propósito último e único da humanidade”. O tráfico de escravos, em particular, iria desempenhar um papel central na industrialização da Inglaterra e no crescimento da manufatura de algodão. Contando os navios negreiros que operavam no comércio de Liverpool nos anos que antecederam a Revolução Industrial, Marx observou: “Em 1730, Liverpool empregava 15 navios no comércio de escravos; em 1751, 53; em 1760, 74; em 1770, 96; e em 1792, 132.”21

Marx termina seu capítulo sobre “Gênese do Capitalista Industrial” com a afirmação de que “se o dinheiro, de acordo com Augier, ‘vem ao mundo com uma mancha de sangue congênita em uma bochecha’, o capital virá pingando da cabeça aos pés, de cada poro, com sangue e sujeira.”22 Lendo esta passagem, é impossível não pensar também na conclusão da Colonization and Christianity de Howitt, que influenciou Marx em um grau tão extraordinário:

Não era suficiente que as terras de todas as regiões recém-descobertas fossem confiscadas por fraude ou violência; não bastava que seus habitantes legítimos fossem assassinados ou escravizados; que os odiosos vícios de pessoas que se autodenominam seguidores do mais puro dos seres fossem derramados como uma peste nestes novos países. Não bastava que milhões e milhões de seres pacíficos fossem exterminados pelo fogo, pela espada, pelos fardos pesados, pela violência vil, pelas minas deletérias e severidades incomuns — pelos cães, pelos caçadores de homens e pela dor e desespero — lá ainda faltava um crime culminante para colocar os feitos dos europeus acima de qualquer rivalidade na causa do mal — e essa abominação inacessível foi encontrada no comércio de escravos. Eles haviam se apoderado de quase todos os outros países, mas não puderam se apoderar das regiões tórridas da África. Eles não puderam se apoderar da terra, mas se apoderaram do povo… Portanto, eles decidiram imolá-los nas sepulturas dos americanos já mortos. Para derramar sangue sobre sangue, para empilhar ossos sobre ossos, e maldições sobre maldições. Que ideia é essa! — os europeus de pé com o açoite da escravidão em suas mãos sobre os ossos de milhões exterminados em um hemisfério, observando com olhos impiedosos suas vítimas arrastadas de outro hemisfério — lavrando, não com seu suor, mas com o sangue de seus corações, o solo que é, na verdade, o pó de gerações de vítimas assassinadas… Toda a história da colonização europeia é parecida.23

Além da extirpação e da escravidão, a crítica de Marx se concentrou no roubo extensivo que caracterizou a expropriação primária subjacente à acumulação de capital na era mercantilista e além, que foi central para o desenvolvimento do capitalismo. Essa expropriação foi realizada nas colônias de povoamento brancas por meio do genocídio da população indígena e da importação de escravos. Assim, surgiu o que Coulthard chamou de “expropriação estruturada”.24 À medida que as populações indígenas foram removidas e esses territórios foram preenchidos com imigrantes/colonos brancos, o problema para o capital acabou se transformando na expropriação dos colonos também.

Assim, a respeito das colônias de povoamento brancas — uma vez que os habitantes indígenas originais do solo foram aniquilados ou expatriados — surgiu um debate em que todos os economistas políticos clássicos ingleses tomaram parte, sobre os efeitos prejudiciais para o capital de uma alta proporção terra/população. Este estado de subpopulação em relação à terra e, portanto, a abundância relativa desta, encorajou o trabalho direto do solo por uma classe de pequenos agricultores formada pelos imigrantes que chegavam, bloqueando assim o desenvolvimento de um proletariado sem propriedade necessário para a industrialização capitalista.25

Marx aqui se concentrou no trabalho de Edward Gibbon Wakefield e outros proponentes do século XIX da “colonização sistemática” nas colônias de povoamento brancas inglesas (principalmente nos Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia). Wakefield insistiu na necessidade de o Estado gerar altos preços da terra por meio da venda e da especulação de terras, a fim de impedir que novas ondas de colonos imigrantes se mudassem imediatamente para a fronteira e se estabelecessem como agricultores de subsistência ou pequenos proprietários, forçando-os a adotar a posição de proletários.26 O fato de que os indígenas quase não contavam em tais debates entre os economistas políticos clássicos sobre as colônias inglesas era um reflexo da circunstância de que, por volta de 1830, a remoção dos nativos americanos da terra era vista como amplamente concluída na América do Norte, embora continuasse a avançar com cada movimento ocidental; enquanto o mesmo processo de remoção de populações aborígenes também estava bem avançado na Austrália e na Nova Zelândia.27

Foi nesse contexto da “teoria moderna do colonialismo” defendida por Wakefield e da economia política do colonialismo que Marx declararia na página final do volume 1 d’O Capital:

Não estamos preocupados aqui [neste ponto lógico do argumento] com a condição das colônias. A única coisa que nos interessa é o segredo descoberto no Novo Mundo pela economia política do Velho Mundo, e ruidosamente proclamado por ela: que o modo de produção e acumulação capitalista, e assim também a propriedade privada capitalista, tem como sua condição fundamental a aniquilação daquela propriedade privada que repousa sobre o trabalho do próprio indivíduo; em outras palavras, a expropriação do trabalhador.28

Isso não deve ser lido, como Coulthard compreensivelmente fez, no sentido de que Marx não estava realmente preocupado com a realidade das instituições coloniais e com o tratamento das populações indígenas, uma vez que seus outros escritos, incluindo o próprio O Capital, contradizem tal interpretação.29 Em vez disso, a crítica de Marx, com base em Wakefield, sugeriu que a retirada da população indígena da terra, para ser substituída por pequenos agricultores, levaria por fim, nas colônias de povoamento brancas, à expropriação progressiva também dos pequenos agricultores como uma condição da gênese do capitalismo industrial.

As investigações de Marx sobre as economias naturais indígenas

De fato, a abordagem de Marx para o colonialismo e as populações indígenas foi muito além da análise de seus contemporâneos, incluindo Howitt, que estava preocupado principalmente com a questão moral do impacto “cristão” dos colonizadores ocidentais sobre os indígenas. Marx, por outro lado, estava muito mais profundamente interessado nas formas de propriedade, produção, troca, gênero, linguagem e cultura material que caracterizaram as nações indígenas ao redor do globo antes da colonização. Assim, em relação às Américas, suas investigações foram principalmente dedicadas à natureza das sociedades indígenas pré-colombianas. Isso ficou evidente pela importância que a descrição de Prescott da economia Inca em History of the Conquest of Peru assumiu no pensamento de Marx, a qual ele continuamente se referiu nos Grundrisse e n’O Capital como representando a categoria crucial da “economia natural”, isto é, uma economia desenvolvida, amplamente comunal, pré-troca ou sem mercadorias.30 Sob os Incas, um indivíduo “não tinha o poder de alienar ou aumentar suas posses” com respeito à terra, que era mantida comunalmente e redistribuída a cada ano.31 Em uma discussão sobre sociedades geradoras de excedentes, Marx iria se referir no volume 3 d’O Capital ao “comunismo artificialmente desenvolvido dos peruanos [incas]”.32

Embora tenha sido frequentemente sugerido que Marx e Friedrich Engels exibiram uma perspectiva desenvolvimentista unilinear que via o capitalismo como desempenhando um papel historicamente progressivo, embora violento, em sua relação com sociedades não capitalistas e, portanto, em suas imposições coloniais sobre “os povos sem história [escrita]”, essas visões ambivalentes a respeito do colonialismo não se estenderam além de seus trinta anos. No final da década de 1850 e antes de Marx escrever O Capital, houve uma mudança decisiva de ênfase em seus escritos e de Engels em direção à defesa das lutas indígenas anticoloniais, exibindo uma forte preocupação e um reconhecimento da importância duradoura das formações culturais/modos de produção não-capitalistas. Muito do ímpeto para essa mudança de perspectiva veio do crescimento de guerras de resistência anticolonial emanadas das próprias populações indígenas, especificamente a revolta argelina contra o colonialismo francês, liderada por Emir Abdelkader nas décadas de 1830 e 40; a Rebelião Taiping de 1850–64; o “Motim indiano” ou o que Marx chamou de “Revolta dos Sepoys” de 1857–59; a luta nacionalista na Irlanda liderada pelos fenianos na década de 1860 e depois; e a Guerra Zulu contra os britânicos em 1879. Em cada um desses casos, Marx e Engels tomaram o lado das forças anticoloniais indígenas.

De fato, em um artigo de 1853 sobre “Os Resultados Futuros do Domínio Britânico na Índia” para o New York Daily Tribune, o Marx de 35 anos, imbuído de otimismo revolucionário, apresentou o colonialismo britânico, à moda hegeliana, como uma “ferramenta inconsciente da história”, representando, embora de forma contraditória, um movimento universal de avanço na história em geral. No entanto, sua crítica ao colonialismo permaneceu aguda: “A profunda hipocrisia e barbárie inerente à civilização burguesa”, escreveu ele, “está desvelada diante de nossos olhos, voltando-se de sua casa, onde assume forma respeitável, para as colônias, onde vai nua. ” A mudança das condições históricas, além disso, permitiria que a crítica geral revolucionária de Marx ao colonialismo emergisse plenamente desenvolvida apenas quatro anos depois. Em 1857, em uma resposta contundente ao colonialismo britânico à luz do que tem sido chamado como Primeira Guerra de Independência da Índia, Marx apoiou a guerra pela “independência nacional” organizada pela “liga revolucionária” que buscava expulsar os britânicos da Índia. O domínio colonial britânico, argumentou ele, foi baseado no “princípio da destruição da nacionalidade” através da destruição pela força, bem como por outros meios. A partir desse ponto, a ênfase de sua análise foi diretamente focada no retrocesso, e não no progresso “inconsciente” associado ao domínio colonial europeu.33

Em seus últimos anos, Marx deixou de lado o trabalho nos volumes 2 e 3 d’O Capital não apenas por causa dessa identificação direta com as revoltas indígenas, mas também pela enorme urgência com que abordou o estudo das sociedades e das formas de propriedade não-capitalistas. Para Marx, a publicação de A Origem das Espécies, de Charles Darwin, e o correspondente aumento de estudos antropológicos investigando as culturas indígenas tradicionais e a pré-história humana, representando o que foi chamado de “revolução no tempo etnológico”, levantou a questão de uma crítica mais completa, mais revolucionária da sociedade capitalista. Essa “revolução” abriu perspectivas para uma compreensão totalmente nova e radical do mundo com a qual mudá-lo.34 Foi nesse período que ele aprendeu russo para estudar a literatura populista daquele país e a obshchina ou mir, a comuna da aldeia camponesa. Após a publicação do volume 1 d’O Capital, Marx também expandiu seus estudos ecológicos, principalmente em relação à agricultura.35 Cada vez mais, porém, seu tempo foi sendo ocupado pelas pesquisas quase desesperadas representadas por seus enormes Cadernos Etnológicos.36 Para Marx, esses estudos incluíam pistas não apenas em relação ao passado, mas também ao futuro.

Os Cadernos Etnológicos de Marx continham extratos (e interpolações) das obras antropológicas de Lewis Henry Morgan, John Budd Phear, Henry Sumner Maine e John Lubbock, extraídos no período de 1880 a 1882. Em 1879, ele também extraiu dos estudos etnológicos do jovem sociólogo russo Maxim Kovalevsky — a quem o próprio Marx instruiu — a partir de um manuscrito de um livro, Communal Landownership: The Causes, Course and Consequences of its Dissolution [Propriedade comunal da terra: as causas, o curso e as consequências de sua dissolução], que o autor havia enviado a ele. Junto com esses estudos, Marx preencheu seus cadernos com investigações sobre a comuna russa, história indígena e história mundial. (As notas de Marx sobre história mundial de 1880 a 1881 a partir das obras de Carlo Giuseppe Guglielmo Botta e Friedrich Christoph Schlosser, consistindo em quatro cadernos de excertos, têm cerca de 1.700 páginas.).37 Em 1880–81, ele anotou passagens de Java; Or, How to Manage a Colony [Java; Ou como administrar uma colônia] (1861) de James William B. Money. Marx e Engels também estudaram The Native Races of the Pacific States of North America [As raças nativas dos estados do Pacífico da América do Norte] (cinco volumes), de Hubert Howe Bancroft, com particular atenção às tribos do sudeste do Alasca e do noroeste do Pacífico.38

Marx tirou extratos interpolados muito extensos da obra-prima de Morgan, Ancient Society [Sociedade Antiga], que foi baseada nos estudos deste último sobre os nativos americanos nos Estados Unidos (e particularmente os iroqueses, sobre os quais Morgan havia escrito um trabalho anterior, League of the Ho-De’-No-Sau-Nee, or Iroquois [Liga dos Ho-De’-No-Sau-Neeou Iroquois]).39 Engels mais tarde compôs seu Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado (1884) com base em Ancient Society de Morgan, notas de Marx sobre Morgan e outras fontes.40 Ao estudar a obra de Morgan, Marx — conforme indicado em suas linhas verticais nas páginas de seus cadernos enfatizando passagens específicas — focou primeiro e principalmente em: (1) a comunidade consangüínea (baseada no parentesco), incluindo sua base na gens ou clã, sua forma democrática e igualdade relativa das mulheres; e (2) as formas de propriedade comunal associadas, constituindo a economia natural com seu comércio sem mercadorias [noncommodity trade]. Marx também prestou atenção às safras cultivadas e às formas de agricultura.41 “Todos os membros das gens iroquesas”, escreveu ele, baseando-se em Morgan, eram “pessoalmente livres, obrigados a defender a liberdade uns dos outros.”42

Como Franklin Rosemont escreveu em “Karl Marx and the Iroquois” [Karl Marx e os Iroqueses]:

Página após página, Marx destaca passagens totalmente distantes do que normalmente são considerados os “temas padrão” de sua obra. Assim, o encontramos invocando a casa em forma de sino das tribos costeiras da Venezuela; a manufatura de cintos iroqueses “com fio fino feito de filamentos de casca de olmo e tília”; “A lenda peruana de Manco Capac e Mama Ocllo, filhos do sol”; costumes funerários dos Tuscarora; a crença dos Shawnee na metempsicose; “literatura não escrita de mitos, lendas e tradições”; as ciências incipientes dos indígenas das aldeias do Sudoeste; o Popul Vuh, livro sagrado do antigo Quiche Maya; o uso de espinhos de porco-espinho na ornamentação; jogos indígenas e “dança [como] forma de adoração”.43

Além de copiosas notas sobre os iroqueses de Morgan, Marx também fez anotações detalhadas sobre os Delaware, Mohegan, Cree, Shawnee, Creek, Chickasaw, Choctaw, Cherokee, Seminole, Dakota, Pawnee, Fox, Blackfoot e muitas outras tribos. Em todos os casos, ele estava interessado na “prática das artes” pelas várias tribos/nações nativas americanas.44 Marx evitou uma noção estritamente unilinear de desenvolvimento evolucionário. Na verdade, seus estudos estavam constantemente focados na reconstituição de antigas formas de sociedades indígenas, e não capitalistas, em um nível histórico superior, ajudado pela persistência de culturas/formas culturais ancestrais.45 “O relato vivaz de Morgan sobre os iroqueses”, escreve Rosemont , “deu a ele [Marx] uma consciência vívida da realidade dos povos indígenas e talvez até mesmo um vislumbre da possibilidade então nunca sonhada de que tais povos pudessem fazer suas próprias contribuições para a luta global pela emancipação humana.”46

Na verdade, Marx ficou fascinado com a afirmação de Morgan de que a antiga gens, como exemplificada pelos iroqueses, continha o núcleo comunal a ser reproduzido em um plano superior da sociedade associativa do futuro. Nas palavras de Morgan, conforme anotadas e enfatizadas por Marx: “Isso [um plano superior da sociedade] será um renascimento, em uma forma superior, da liberdade, igualdade e fraternidade das antigas gentes [sociedade de parentesco comunal].”47 Isso se assemelhava à visão anterior de Marx, conforme declarado em uma carta de 1868 a Engels, de que era necessário “olhar além da Idade Média para a era primitiva de cada povo — e isso corresponde à tendência socialista, embora esses homens eruditos [Georg Ludwig von Mauer, conhecido por seus estudos da sociedade comunal alemã primitiva, e Jakob Grimm, o filólogo e historiador cultural] não tenham ideia de que [as formas comunais “primitivas”] estão ligadas a ela [a tendência socialista]. E ficam surpresos ao descobrir o que há de mais novo no mais antigo.”48

A mesma lógica histórica geral está presente nos excertos de Marx sobre as culturas indígenas na América Latina do livro Communal Landownership de Kovalevsky. Aqui, Marx estava particularmente interessado na produção comunal indígena, na desintegração desta sob a influência dos espanhóis e nas formas subsequentes de dominação colonial.49 Assim, em suas notas sobre o tratamento colonial espanhol dos indígenas americanos, Marx registrou (os grifos, neste caso, representando suas inserções): “A política espanhola original de extermínio do homem vermelho. Após a pilhagem do ouro etc. que encontraram, os índios são condenados a trabalhar nas minas. Com o declínio do valor do ouro e da prata, os espanhóis se voltam para a agricultura, escravizam os índios para cultivar a terra para eles.”50

Uma investigação semelhante sobre os efeitos da colonização nas formas comunais de produção pode ser vista nas notas e escritos de Marx a respeito da Argélia e da Índia. Em seus extratos interpolados de Kovalevsky sobre a Argélia, Marx (via Kovalevsky) observou que “séculos de domínio árabe, turco e finalmente francês, exceto no período mais recente… foram incapazes de quebrar a organização consanguínea [baseada no parentesco] e os princípios da indivisibilidade e inalienabilidade da propriedade da terra.”51 No entanto,

A primeira preocupação dos franceses após a conquista de uma parte da Argélia foi declarar a maior parte do território conquistado como propriedade do governo (francês). … Louis-Philippe, como sucessor do Imam… agarra não apenas a propriedade pública [propriedades fundiárias], mas também todas as terras não cultivadas, incluindo pastagens comunais, florestas e terras não cultivadas. … Desta forma: por um lado, os ex-proprietários de terras comunais <são> forçadamente rebaixados à posição de ocupantes temporários das terras do governo; por outro lado, <há> roubo à força de partes significativas do território ocupado pelos clãs, que são então cultivadas por colonos europeus. ... As terras comunais — sob Luís Filipe — foram colocadas à livre disposição da administração civil-militar estabelecida na colônia.52

A expropriação francesa das terras comunais foi oficializada pela infame lei de 1873, “que finalmente estabeleceu a propriedade privada da terra; todo árabe agora podia dispor livremente do lote de terreno reservado para ele como propriedade privada; o resultado será: a expropriação do solo da população nativa por colonos e especuladores europeus ”. Não havia dúvida para Marx ou Kovalevsky de que isso constituía um “roubo direto!” Marx escreve em suas notas: “A expropriação dos árabes pretendida pela lei: 1) a fim de fornecer aos franceses o máximo de terra possível; 2) separando os árabes de seu vínculo natural com o solo para quebrar as últimas forças das uniões de clãs, sendo assim dissolvidas e, portanto, qualquer perigo de rebelião.”53

Kovalevsky e Marx argumentaram que, a fim de tomar as terras comunais dos argelinos e transformá-las em propriedade privada, o governo francês promoveu a ideia de que o monarca ou Estado colonial eram o herdeiro legítimo de todas as terras comunais, bem como das florestas e terras não cultivadas — uma política também adotada pelos ingleses na Índia e mais notoriamente propagada por James Mill, com cuja obra Marx estava muito familiarizado.54

Na tentativa de restaurar sua saúde, Marx passou dois meses em Argel em 1882, um ano antes de sua morte e apenas alguns anos depois de reunir seus extratos de Kovalevsky sobre a Argélia. Em suas cartas a sua filha Laura Lafargue, ele indiciou sua admiração pelos muçulmanos argelinos pela “igualdade absoluta em suas relações sociais. ... No entanto, eles irão à ruína SEM UM MOVIMENTO REVOLUCIONÁRIO.”55

Nos extratos de Marx a partir de Kovalevsky, também encontramos a observação de que em Punjab, no norte da Índia, “por ‘hipoteca’ ou ‘alienação’, — sancionada por lei, — o governo inglês trabalha na dissolução… da propriedade coletiva dos camponeses, sua expropriação final, a evolução da terra comunal para a propriedade privada do usurário.”56 Comentando (via Kovalevsky) sobre o“ roubo da propriedade comunal e privada dos camponeses ”, Marx observou em seu cadernos de extratos que isso levou a “toda uma série de levantes locais dos camponeses contra os ‘proprietários de terras’”.57

Refletindo sobre a política colonial inglesa na Índia, Marx escreveu em seu “Rascunho de Cartas para Vera Zasulich” que “a supressão da propriedade da terra comunal nada mais foi do que um ato de vandalismo inglês que levou a população indígena para trás em vez de para a frente”.58 Os ingleses , ele reconheceu, deveriam ser distinguidos de todos os ocupantes anteriores da Índia por não terem mantido irrigação, canais, represas, reservatórios, sistemas de drenagem, unidades de armazenamento de grãos e outras infra-estruturas públicas, criando assim o cenário para fomes massivas. Em suas notas em 1867 de um relatório especial sobre a fome de Orissa conduzido para a Câmara dos Comuns, Marx destacou que “a tendência a um cultivo crescente” resultou na “desnudação das florestas naturais”, tornando “as estações mais severas e inundações mais rápidas e extensas.”59

Em todos os seus vários tratos de economias naturais e formações culturais indígenas — mais dramaticamente na importância futura da comuna camponesa russa ou obshchina — Marx invariavelmente viu essas sociedades indígenas e não-capitalistas como reflexo de uma longa luta pelo desenvolvimento humano livre, que incluía a luta pela sobrevivência das sociedades indígenas e pelo controle de suas próprias terras e vidas.

Baseando-se Spectres of Marx [Espectros de Marx] de Jacques Derrida e, portanto, indiretamente em Marx, Gerald Vizenor destacou o conceito de sobrevivência [survivance] em face do terror e do genocídio como um exemplo da experiência indígena. “A sobrevivência nativa é um sentido ativo de presença sobre a ausência… As histórias de sobrevivência são renúncias ao domínio, às detrações, obstruções, aos sentimentos insuportáveis de tragédia e ao legado de vitimização. ... É uma resistência e repúdio ativos.”60

Marxismo e os Indígenas

A maioria das críticas ao marxismo por sua falta de valorização das culturas e lutas indígenas são inespecíficas, apenas atribuindo ao materialismo histórico um determinismo econômico e tecnológico, um compromisso acrítico com o desenvolvimentismo, uma promoção extrema de uma produção cada vez maior acima de tudo (isto é, produtivismo) e uma ênfase no proletariado às custas dos camponeses e indígenas. Embora essas sejam definitivamente características de certas tradições marxistas, algumas das quais até desempenharam papéis dominantes, elas dificilmente caracterizam o pensamento de Marx ou Engels, ou das tradições revolucionárias críticas do marxismo em geral.

De fato, Engels adotou uma postura um tanto trágica em relação às comunidades indígenas, elogiando-as ainda mais do que Marx, enquanto às vezes escrevia como se sua extinção fosse inevitável devido às fraquezas da forma tribal de sociedade que estava presa em suas próprias limitações e teve que dar lugar a outras formas de organização cultural, como já se manifestava de forma contraditória na Confederação Iroquesa.61 Por outro lado, a abordagem com mais nuances de Marx era mais questionadora das culturas indígenas — por exemplo, exibindo reservas em relação às reivindicações de igualdade de gênero entre os iroqueses — e ao mesmo tempo mais aberto à ideia de que as culturas indígenas poderiam persistir e se reconstituir por meio de lutas históricas.62 No entanto, a maioria dos escritos de Marx a esse respeito, incluindo seus Cadernos Etnológicos, permaneceram desconhecidos, e foi a abordagem trágica de Engels que prevaleceu na Segunda Internacional na obra de alguns dos herdeiros de Marx, como Paul Lafargue, Karl Kautsky e Georgi Plekhanov, mas de uma forma muito mais tecnologicamente determinista e rigidamente desenvolvimentista do que pode ser atribuída a Engels (muito menos a Marx).63 Ainda assim, nenhum desses epígonos é hoje considerado exemplar do pensamento marxista clássico. De significado muito mais duradouro são as fortes defesas de Rosa Luxemburgo das economias indígenas e naturais, a insistência de V.I. Lenin na autodeterminação nacional de todos os povos e a rica costura de marxismo e indigenismo de José Carlos Mariátegui — todos apontando para uma crítica mais profunda do desenvolvimento capitalista eurocêntrico.64

Não só o marxismo inspirou movimentos de libertação nacional em toda a periferia da economia mundial capitalista, mas, começando na década de 1950 e estendendo-se até a década de 1970, houve grandes tentativas de integrar a teoria marxista com as lutas dos nativos americanos no trabalho de figuras como Eleanor Burke Leacock, Patricia Albers, Bruce Johansen, Roberto Maestas, Lawrence David Weiss, Howard Adams e outros.65 Como Johansen enfatizou, o próprio marxismo, devido ao estudo de Marx e Engels sobre os iroqueses através de Morgan, deveu muito às culturas indígenas.66 Mais recentemente, o Movimento Ao Socialismo da Revolução Boliviana extraiu muito de sua vitalidade de uma tradição revolucionária vernácula enraizada tanto no marxismo quanto no indigenismo.67

Atualmente, há um novo florescimento do trabalho que surge das tradições revolucionárias marxistas e indígenas. O trabalho revolucionário de Coulthard em Red Skin, White Masks forja uma rica síntese entre Marx, Frantz Fanon e as perspectivas indígenas em sua rejeição radical da “política colonial de reconhecimento”. A descrição brilhante de Allan Greer das formas de propriedade dos nativos americanos e expropriação colonial no surgimento da América do Norte moderna em seu Property and Dispossession [Propriedade e Alienação] está organicamente conectada às pesquisas de figuras como Morgan, Marx e Engels.68 Roxanne Dunbar-Ortiz oferece uma análise marxista-indígena de como a fundação dos Estados Unidos e sua expansão contínua está enraizada na “ideologia da supremacia branca, na prática generalizada da escravidão africana e em uma política de genocídio e roubo de terras.”69 Em The Apocalypse of Settler Colonialism [O Apocalipse do Colonialismo de Povoamento], Gerald Horne explica como o genocídio de povos indígenas e o não menos horrível desenvolvimento da escravidão foram entrelaçados na ascensão do sistema capitalista de dominação mundial. Nick Estes fornece uma história notável dos séculos de resistência indígena e persistência revolucionária, “cavando” como a toupeira de Marx enquanto parte do “movimento mais longo da história.”70 Deve-se notar que a crítica generalizada de hoje ao colonialismo de povoamento foi precedida por tratamentos marxistas do assunto dentro da teoria do imperialismo na obra de pensadores como Marx, Engels, Luxemburgo, Arghiri Emmanuel, Harry Magdoff, Dunbar-Ortiz e Moshé Machover.71

Em todas essas obras, derivadas do materialismo histórico, há uma ênfase na expropriação/desapropriação forçada de culturas indígenas como um processo contínuo — um processo em que o colonialismo, em vez de simplesmente ser um elemento do passado, continua a ser parte integrante da dominação capitalista dos povos e da terra. Disto flui uma resistência irreprimível que assume muitas formas diferentes, mas ainda assim se recusa a ceder.

Conclusão: A Revolução Anti-Colonial/Anti-Capitalista

Em Red Skins, White Masks, Coulthard argumenta “em relação a Marx, que três questões devem ser abordadas em seu trabalho para tornar seus escritos sobre colonialismo relevantes para a análise da relação entre os povos indígenas e as políticas de colonos liberais”. Em primeiro lugar, “a tese de Marx sobre a acumulação primitiva deve ser despojada de seu caráter temporal”, o que a limita aos estágios iniciais da formação capitalista. Em segundo lugar, o argumento de Marx “deve ser despojado de seu caráter desenvolvimentista normativo.” Terceiro, a abordagem marxista do capitalismo colonial deve se livrar de sua associação puramente com a força e violência e ser vista em termos da “capacidade do sistema de produzir formas de vida que fazem as hierarquias constitutivas do colonialismo colonizador parecerem naturais”.72 As três questões de Coulthard são de fato condições para qualquer tipo de análise histórico-materialista viável de experiências indígenas em contextos de colonialismo de povoamento (ou, mais amplamente, em contextos coloniais e pós-coloniais). O argumento anterior sugere que a necessária reconstrução e recuperação da teoria marxista clássica já está ocorrendo.73

A este respeito, é importante notar, como estudos recentes vêm demonstrando, que Marx não tinha “uma tese da acumulação primitiva” como tal, mas sim uma crítica do que chamou de “conto infantil” da acumulação primária baseada na abstinência. que caracterizou a economia burguesa, a qual ele substituiu pelo conceito de expropriação.74 Tampouco a abordagem de Marx da expropriação foi fixada temporalmente. Em vez disso, a expropriação era vista como uma produção e reprodução contínua das condições básicas em que o capital operava. Portanto, ao discutir o processo de expropriação na parte VIII do volume 1 d’O Capital sobre “A assim chamada acumulação primitiva”, Marx se referiu não apenas ao passado distante, mas também ao que para ele era o presente como história: os recintos na Escócia em 1814–48 iniciada pela Duquesa de Sutherland, a conversão de pastos de ovelhas em florestas de cervos (sem árvores) na década de 1860 na Inglaterra, e a fome na província de Orissa, Índia, em 1866, resultante do domínio inglês.75 De forma alguma foi tal expropriação vista como confinada à era pré-industrial ou início da era industrial.

Mais importante foi a rejeição de Marx de uma perspectiva “desenvolvimentista normativa” simples e unilinear com relação à colonização. Em sua análise das populações indígenas nas Américas, África e Ásia, particularmente a partir do final da década de 1850, ele investigou continuamente as formas de propriedade comunal e as bases culturais e linguísticas dessas sociedades, com a ideia de que a história não era simplesmente linear. Para ele, o colonialismo em si era algo secundário, porque as formas culturais e de propriedade indígenas permaneceram historicamente vivas. Foi com base nisso que Marx e Engels, a partir dos trinta e tantos anos, tomaram partido das várias revoltas dos povos indígenas em todo o mundo, defendendo suas revoluções e reconhecendo que representavam algo vital culturalmente e em termos de comunidade humana e formas de propriedade que foram contra a economia mercantil do capitalismo. Apesar da tendência de Marx e Engels para um “desenvolvimentismo normativo” na casa dos vinte anos, o terreno havia mudado claramente para eles muito antes de completarem os trinta.

Como Engels escreveu em 1890, a concepção materialista original da história foi ampliada nos escritos de Marx e em seus próprios escritos posteriores, uma vez que foi reconhecido que “toda a história deve ser estudada de novo.” Isso incluía a história do mundo não-europeu. Nas palavras do sociólogo Michael R. Krätke,

Marx não deu espaço ao eurocentrismo; ele de forma alguma considerou a história mundial como sinônimo de “história europeia”. ... Ele estudou a história da Ásia Menor, do Oriente Próximo e Oriente Médio, do mundo islâmico, das Américas e da Ásia (com três centros de foco: Índia, China, e Ásia Central). ... Ele estudou a história colonial das potências coloniais mais importantes e, de fato, também a história dos países colonizados pelos europeus (América do Norte, América Latina, Indonésia, Norte da África).76

Em todo esse trabalho, Marx se afastou de uma lente eurocêntrica e desenvolvimentista. Sua preocupação com o colonialismo de povoamento atingiu a história e a cultura das sociedades indígenas, identificando-se com sua resistência e vendo em seu passado (e presente) a possibilidade de um futuro mundial mais amplo.

A questão de como a relação colonial, uma vez implantada, se reforça ideologicamente por meio de “sua capacidade de produzir formas de vida que fazem as hierarquias constitutivas do colonialismo de povoamento parecerem naturais” é um domínio em que Fanon, como diz Coulthard, é um guia mais útil do que Marx.77 No entanto, há indiscutivelmente apenas uma curta distância entre as denúncias furiosas de Marx, via Kovalevsky, da manipulação e do desreconhecimento “Vergonhosos!” do colonialismo de povoamento francês em relação à lei islâmica para justificar a expropriação da terra “comunal do clãs” do povo argelino, e a forte insistência de Fanon — com toda a força da luta de libertação nacional argelina dos anos 1950 antes dele (e com Hegel e Marx em seus lábios) — em uma alteridade de reconhecimento revolucionária:

Peço que eu seja levado em consideração com base no meu desejo. Não estou apenas aqui e agora, preso na condição de coisa. Desejo outro lugar e algo mais. Exijo que se dê conta da minha atividade contraditória na medida em que busco algo diferente da vida, na medida em que luto pelo nascimento de um mundo humano, ou seja, um mundo de reconhecimentos recíprocos. 
Aquele que reluta em me reconhecer está contra mim. Em uma luta feroz, estou disposto a sentir o estremecimento da morte, a extinção irreversível, mas também a possibilidade da impossibilidade.78

Notas

1. Kerstin Knopf, “The Turn Toward the Indigenous,” American Studies 60, no. 2/3 (2016): 179–200.
2. Ver Sagar Sanyal, “Marxism and Post-Colonial Theory,” Marxist Left Review 18 (2019).
3. Ver, por exemplo, os ensaios em Ward Churchill, ed., Marxism and Native Americans (Boston: South End, 1999); Russell Lawrence Barsh, “Contemporary Marxist Theory and Native American Reality,” American Indian Quarterly 12, no. 3 (Verão de 1988): 187–211; Glen Sean Coulthard, Red Skins, White Masks: Rejecting the Colonial Politics of Recognition (Minneapolis: University of Minnesota Press, 2014), 9–10.
4. Coulthard, Red Skin, White Masks, 6–15. Para uma resposta bastante extensiva à noção de que a terra foi tomada simplesmente como um “presente gratuito”, não relacionado à exploração/expropriação, na teoria marxiana, consulte John Bellamy Foster e Brett Clark, The Robbery of Nature (New York: Monthly Review Press, 2020).
5. Sobre a advertência de Marx contra tratar o materialismo histórico como “supra-histórico”, veja Karl Marx, “A Letter to the Editorial Board of Otechestvennye Zapiski,” em Late Marx and the Russian Road, ed. Teodor Shanin (New York: Monthly Review Press, 1983), 136.
Georg Lukács, History and Class Consciousness (Cambridge, MA: MIT Press, 1968), 1.
Coulthard, Red Skin, White Masks, 9–11.
Karl Marx, O Capital, vol. 1 (London: Penguin, 1976), 915, enfase adicionada.
Marx, O Capital, vol. 1, 871, 915; John Bellamy Foster e Brett Clark, “The Expropriation of Nature,” Monthly Review 69, no. 10 (2018): 1–27.
Marx, O Capital, vol. 1, 917–18; William Howitt, Colonization and Christianity: A Popular History of the Treatment of the Natives by Europeans in All Their Colonies (London: Longman, Orme, Brown, Green, and Longmans, 1838), 346–49, 378–79. Como Marx, Engels usou o termo colônias para se referir a “países ocupados por uma população europeia”, particularmente os Estados Unidos, Canadá, Austrália e a colônia do Cabo na África do Sul — uma categoria para a qual o colonialismo de povoamento é agora comumente usado. Engels também indicou que as colônias de colonos brancos seriam as primeiras a se tornarem independentes da metrópole. Veja Karl Marx e Frederick Engels, Collected Works (New York: International Publishers, 1975), vol. 46, 322.
Howitt, Colonization and Christianity, 403–5.
Howitt, Colonization and Christianity, 403–4, 414. “Remoção” de Nativos Americanos, Merivale escreveu em seu capítulo sobre “Raças selvagens”, representando a visão do colonialismo dos colonos brancos, “é … inevitavelmente, apenas um remédio temporário para males permanentes e deve ser repetido permanentemente.” Herman Merivale, Lectures on Colonization and Colonies (London: Longman, Orme, Brown, Green, and Longmans, 1841), 508–9 — as citações aqui são da segunda edição de 1861, reimpressa pela Oxford University Press em 1928.
William H. Prescott, History of the Conquest of Mexico/History of the Conquest of Peru (New York: Modern Library, sem data [originalmente publicado separadamente em 1843/1847]); Thomas Fowell Buxton, The African Slave Trade and Its Remedy (London: John Murray, 1840); Hal Draper, ed., The Marx-Engels Glossary (New York: Schocken, 1986), 36, 167.
Karl Marx, Grundrisse (London: Penguin, 1973), 833.
Sir Thomas Stamford Raffles, The History of Java (em dois volumes), 2nd ed. (London; John Murray, 1830).
Marx, O Capital, vol. 1, 916.
Marx, O Capital, vol. 1, 916, 918; Raffles, History of Java, vol. 2, xcvi–civ; Howitt, Colonization and Christianity, 194–201. N’O Capital, Marx parece ter confiado no tratamento de Howitt dos holandeses em Java — que é baseado na História de Java de Raffles — em vez de diretamente na obra de Raffles (que Marx leu), uma vez que todos os fatos aos quais ele se refere são citados em Howitt e com linguagem semelhante.
Para uma história crítica da British East India Company, ver Ramkrishna Mukherjee, The Rise and Fall of the East India Company (New York: Monthly Review Press, 1974).
Marx, O Capital, vol. 1, 917; Howitt, Colonization and Christianity, 255–56, 268–71.
Marx, O Capital, vol. 1, 917; Karl Marx e Frederick Engels, Marx/Engels Gesamtausgabe (MEGA), IV, 18 (Berlin: Walter de Gruyter, 2019), 670–74, 731; Mike Davis, Late Victorian Holocausts (London: Verso, 2001).
Marx, O Capital, vol. 1, 918, 924–25; ver também Sven Beckert, Empire of Cotton (New York: Vintage, 2014).
Marx, O Capital, vol. 1, 925–26.
Howitt, Colonization and Christianity, 501–3.
Coulthard, Red Skin, White Masks, 7.
Ver Donald Winch, Classical Political Economy and Colonies (Cambridge, MA: Harvard University Press, 1965); A. G. L. Shaw, Great Britain and the Colonies (London: Methuen and Co., 1970).
Merivale, Lectures on Colonization and Colonies, 387–89; Edward Gibbon Wakefield, ed., A View of the Art of Colonization (Oxford: Oxford University Press, 1814); Edward Gibbon Wakefield, ed., England and America(New York: Harper and Brothers, 1834).
An Indigenous Timeline,” New South Wales Government, disponível em http://teachingheritage.nsw.edu.au; Moshé Machover chama isso de “colonização de exclusão” para enfatizar os efeitos sobre os indígenas. Ver Moshé Machover, “Colonialism and the Natives,” Weekly Worker 1087 (2015).
Marx, O Capital, vol. 1, 940.
Coulthard, Red Skin, White Masks, 10–11.
“The Struggle Against Natural Economy”é o título de um capítulo de A Acumulação do Capital, de Rosa Luxemburgo, que desenvolve argumentos a respeito da colonização das economias naturais por Marx e Maxim Kovalevsky. Ver Rosa Luxemburg, The Accumulation of Capital (New York: Monthly Review Press, 1951), 368–85. Para o conceito de economia natural em Marx e Luxemburg, ver Scott Cook, Understanding Commodity Economies (New York: Rowman and Littlefield, 2004), 114, 130–31, 151.
Prescott, History of the Conquest of Mexico/History of the Conquest of Peru, 756–57.
Karl Marx, O Capital, vol. 2 (London: Penguin, 1978), 196, 226; Marx, Capital, vol. 3, (London: Penguin, 1981), 1017.
Sunti Kumar Ghosh, “Marx on India,” Monthly Review 35, no. 8 (January 1984): 39–53; Karl Marx e Frederick Engels, The First Indian War of Independence, 1857–1859 (Moscow: Progress Publishers, 1968), 20, 35, 47, 92–93, 140; Karl Marx, Notes on Indian History (664–1858) (Moscow: Progress Publishers, no date), 150; Marx e Engels, Collected Works, vol. 18, 60–70, 212–13; Frederick Engels, The Origin of the Family, Private Property, and the State (New York: International Publishers, 1970), 159–60. Ver também Kenzo Mohri, “Marx and ‘Underdevelopment,’” Monthly Review 30, no. 11 (April 1979): 32–42; Horace B. Davis, Nationalism and Socialism (New York: Monthly Review Press, 1967), 63–69; John Bellamy Foster, “Marx and Internationalism,” Monthly Review 52, no. 3 (July–August 2000): 11–13; Umberto Melotti, Marx and the Third World (London: Macmillan Press, 1977); Eric. R. Wolf, Europe and the People Without History (Berkeley: University of California Press, 1982). [¶]Embora Engels, na casa dos vinte anos, considerasse a invasão francesa da Argélia como um fator que levaria ao progresso da civilização, ele se afastou dessa posição no final dos trinta, elogiando Abdelkader em seu artigo de 1857 para a New American Cyclopedia e argumentando que “supremacia francesa” na Argélia foi “ilusório” face à independência e resistência dos argelinos. Marx and Engels, Collected Works, vol. 18, 60–70. [¶]O conceito de Marx do modo de produção asiático, um termo que ele abandonou depois de 1859, foi baseado em escritos político-econômicos clássicos anteriores de James Mill, John Stuart Mill e Richard Jones, que eventualmente evoluíram para uma teoria complexa da especificidade dos modos de produção na Ásia, particularmente na Índia, transcendendo a noção anterior de que essas sociedades eram caracterizadas pela estagnação. Além disso, a própria ideia de um modo de produção asiático, desenvolvida por Marx, se desviou de qualquer teoria unilinear do desenvolvimento, levantando a questão de caminhos alternativos. Ver Krader, The Asian Mode of Production, 5–7, 183, 292; John Bellamy Foster e Hannah Holleman, “Weber and the Environment,” American Journal of Sociology 117, no. 8 (2012): 1640–41.
Sobre “a revolução no tempo etnológico”, ver Thomas Trautmann, Lewis Henry Morgan and the Invention of Kinship (Berkeley: University of California Press, 1987), 35, 197, 220, 227, 264; John Bellamy Foster, Marx’s Ecology (New York: Monthly Review Press, 2000), 212–21. Sobre a própria resposta de Marx à revolução no tempo etnológico, ver Marx e Engels, Collected Works, vol. 42, 557.
Ver Kohei Saito, Karl Marx’s Ecosocialism (New York: Monthly Review Press, 2017).
Karl Marx, Ethnological Notebooks, ed. Lawrence Krader (Assen, Netherlands: Van Gorcum and Co., 1974). Muito do que constituiu os cadernos etnológicos de Marx ainda precisa ser publicado.
Karl Marx, “Excerpts from M. M. Kovalevsky,” apêndice de Lawrence Krader, The Asiatic Mode of Production (Assen, Netherlands: Van Gorcum and Co., 1975); Peter Hudis, “Marx Among the Muslims,” Capitalism Nature Socialism 15, no. 4 (2004): 58; Michael R. Krätke “Marx and World History,” International Review of Social History 63 (2018): 91–125. O título da obra de Kovalevsky usado no texto aqui segue a tradução em James D. White, Karl Marx and the Origins of Dialectical Materialism (New York: St. Martin’s, 1996), 260. See also L. S. Gamayunov and R. A. Ulyanovsky, The Work of the Russian Sociologist M. M. Kovalevsky, “Communal Landholding, the Causes, Ways and Consequences of Its Disintegration,” and K. Marx’s Criticism of the Work (Moscow: Oriental Literature Publishing House, 1960).
Kevin B. Anderson, Marx at the Margins (Chicago: University of Chicago Press, 2010), 218–19. Marx, Ethnological Notebooks, 183, 431; Marx and Engels, Collected Works, vol. 46, 394–95; Hubert Howe Bancroft, The Native Races of the Pacific States of North America (five volumes, 1875), ver especialmente vol. 1, 109; Engels, The Origin of the Family, Private Property and the State, 218.
Lewis Henry Morgan, Ancient Society (New York: World Publishing Co., 1963); Lewis Henry Morgan, League of the Iroquois (New York: Carol Communications, 1962).Em League of the Iroquois, Morgan escreveu: “Não é um crime pequeno contra a humanidade confiscar os serões e a propriedade de uma comunidade inteira, sem um equivalente, e sem sua vontade”, referindo-se ao confiscador de terras iroquesas da Ogden Land Company.
Engels, The Origin of the Family, Private Property, and the State, 71–73.
Lawrence Krader, introduction to Ethnological Notebooks, by Karl Marx, 24–28.
Marx, Ethnological Notebooks, 150.Como Marx observou aqui, os iroqueses se autodenominavam “Povo da Longa Casa” (168).
Franklin Rosemont, “Karl Marx and the Iroquois,” in Arsenal: Surrealist Subversion, by Nelson Algren et al. (Chicago: Black Swan, 1989), 205.
Marx, Ethnological Notebooks, 174–86.
Krader, introduction to Ethnological Notebooks, 14.
Rosemont, “Karl Marx and the Iroquois,” 207.
Marx, Ethnological Notebooks, 139.
Marx e Engels, Collected Works, vol. 42, 557–59.
A extensa correspondência de Marx com Kovalevsky foi queimada pelo amigo de Kovalevsky, o economista I. I. Ivanyukov, a quem foi confiada enquanto Kovalevsky estava em uma viagem ao exterior. Ivanyukov entrou em pânico, temendo que sua casa fosse revistada pela polícia e destruísse as cartas — um medo que se revelou exagerado. White, Karl Marx and the Intellectual Origins of Dialectical Materialism, 262.
Marx citado em Kevin Anderson, Marx at the Margins, 221.
Marx, “Excerpts from M. M. Kovalevsky,” 400.
Marx, “Excerpts from M. M. Kovalevsky,” 406–7. Italics and brackets in the original.
Marx, “Excerpts from M. M. Kovalevsky,” 411–12.
Draper, ed., The Marx-Engels Glossary, 142. Sobre as visões distorcidas de James Mill sobre a Índia, ver Mukherjee, The Rise and Fall of the East India Company.
Karl Marx para Laura Lafargue, April 13, 1882, Collected Works, vol. 46, 242; Hudis, “Marx Among the Muslims,” 67; Raya Dunayevskaya, Rosa Luxemburg, Women’s Liberation, and Marx’s Philosophy of Revolution(Urbana, IL: University of Illinois Press, 1991), 191.
Marx, “Excerpts from M. M. Kovalevsky,” 410.
Marx, “Excerpts from M. M. Kovalevsky,” 387.
Karl Marx, “Draft Letters to Vera Zasulich,” in Late Marx and the Russian Road, 118.
Marx, “Excerpts from M. M. Kovalevsky,” 387; Marx and Engels, The First Indian War of Independence, 34–35; Marx and Engels, MEGA, IV, 18, 670–74; Marx, Capital, vol. 1, 650; Marx and Engels, Collected Works, vol. 46, 63–64.
Gerald Vizenor, “Aesthetics of Survivance,” in Survivance: Narratives of Native Presence, ed. Gerald Vizenor (Lincoln: University of Nebraska Press, 2008), 1, 11, 20–21; James Mackay, “Ghosts in the Gaps,” in Survivance, 256–57; Jacques Derrida, Spectres of Marx (London: Routledge, 2006), xviii. A questão da sobrevivência aponta para a realidade do culturicídio das nações indígenas, um processo que anda de mãos dadas com o genocídio e persiste como parte de uma colonização contínua. Ver especialmente James V. Fenelon, Culturicide, Resistance, and Survival of the Lakota (“Sioux Nation”) (New York: Garland, 1998).
Ver Engels, The Origin of the Family, Private Property, and the State, 159–60; David Bedford and Danielle Irving, The Tragedy of Progress: Marxism, Modernity and the Aboriginal Question (Halifax, Nova Scotia: Fernwood, 2001), 76–78. Em princípio, havia muito pouca diferença entre as visões de Marx e Engels, os quais torciam pela resistência, sobrevivência e reconstituição das culturas comunais indígenas.
Anderson, Marx at the Margins, 201–2, 226–30; Dunayevskaya, Rosa Luxemburg, Women’s Liberation, and Marx’s Philosophy of Revolution, 180–83; Rosemont, “Karl Marx and the Iroquois,” 205–6.
Maurice Bloch, Marxism and Anthropology (Oxford: Oxford University Press, 1983), 99–107.
Luxemburgo, The Accumulation of Capital, 368–85; V. I. Lenin, The Right of Nations to Self-Determination (Moscow: Progress Publishers, 1975); José Carlos Mariátegui, José Carlos Mariátegui: An Anthology, ed. Harry E. Vanden and Marc Becker (New York: Monthly Review Press, 2011); Samir Amin, Eurocentrism (New York: Monthly Review Press, 2009).
Eleanor Leacock, introduction to Morgan, Ancient Society, Ii–Ixx; Leacock, Myths of Male Dominance (New York: Monthly Review Press, 1982); Patricia C. Albers, “Autonomy and Dependency in the Lives of Dakota Women,” Review of Radical Political Economics 17, no. 3 (1985): 109–34; Bruce Johansen and Roberto Maestas, Wasi’chu: The Continuing Indian Wars (New York: Monthly Review Press, 1979); Lawrence David Weiss, The Development of Capitalism in the Navajo Nation: A Political-Economic History (Minneapolis: MEP Publications, 1984); Howard Adams, Prison of Grass (Saskatoon: Fifth House, 1989); Bedford and Irving, The Tragedy of Progress. Para contribuições recentes relacionadas ao capitalismo racial e ao colonialismo de povoamento, ver Roxanne Dunbar-Ortiz, An Indigenous Peoples’ History of America (Boston: Beacon, 2014); Gerald Horne, The Apocalypse of Settler Colonialism (New York: Monthly Review Press, 2018). Sobre o ressurgimento da bolsa de estudos marxista sobre os nativos americanos na antropologia nas décadas de 1950 a 1970, ver Patricia C. Albers, “Labor and Exchange in American Indian History” in A Companion to American Indian History, ed. Philip J. Deloria and Neal Salisbury (Oxford: Blackwell, 2004), 269–86; Samuel W. Rose, “Marxism and Mode of Production in the Anthropology of Native North America,” Focaal Blog, November 17, 2015.
Johansen, Wasi’chu, 33.
Álvaro García Linera, “Indianismo and Marxism: The Missed Encounter of Two Revolutionary Principles,” MR Online, January 31, 2008.
Allan Greer, Property and Dispossession: Natives, Empires and Land in Early Modern America (Cambridge: Cambridge University Press, 2018).
Dunbar-Ortiz, An Indigenous Peoples’ History of America, 2; Gerald Horne, The Apocalypse of Settler Colonialism, 7–18.
Nick Estes, Our History Is the Future: Standing Rock versus the Dakota Access Pipeline, and the Long Tradition of Indigenous Resistance (New York: Verso, 2019), 18.
Arghiri Emmanuel, “White Settler Colonialism and the Myth of Investment Imperialism,” New Left Review 73 (1972): 35–57; Harry Magdoff, Imperialism: From the Colonial Age to the Present (New York: Monthly Review Press, 1978), 19–20; Roxanne Dunbar-Ortiz, “Aboriginal People and Imperialism in the Western Hemisphere,” Monthly Review 44, no. 4 (September 1992): 1–13; Machover, “Colonialism and the Natives.”
Coulthard, Red Skin, White Masks, 151–52.
Isso se relaciona também a uma quarta questão que Coulthard levanta a respeito de Marx e da ecologia. Aqui, ele se refere (embora reconhecendo interpretações divergentes) à noção de que “as perspectivas de Marx sobre a natureza aderia a uma racionalidade instrumental que não dava valor intrínseco à terra ou à própria natureza e que isso subsequentemente o levou a defender acriticamente uma ideologia de produtivismo e insustentável progresso econômico.” Coulthard, Red Skin, White Masks, 13–14. No entanto, a pesquisa em ecologia marxista ao longo dos últimos vinte anos definitivamente refutou esses mitos equivocados sobre a teoria de Marx, com o resultado de que muito da melhor teoria e prática do trabalho marxista está procedendo na mesma direção do próprio Coulthard. Sobre este assunto, ver Paul Burkett, Marx and Nature (New York: St. Martin’s, 1999); Foster, Marx’s Ecology; John Bellamy Foster, Brett Clark, e Richard York, The Ecological Rift (New York: Monthly Review Press, 2010); Saito, Karl Marx’s Ecosocialism; Hannah Holleman, Dust Bowls of Empire (New Haven: Yale University Press, 2018); and Foster and Clark, The Robbery of Nature.
Marx, Capital, vol. 1, 871, 874. Marx se referiu à “chamada acumulação primária”, enfatizando que não era acumulação de forma alguma a que se referia, mas expropriação de títulos ou reivindicações de terras, propriedades e até corpos — isto é, roubo. O que nem deveria ser visto como “primitivo” — uma tradução incorreta, melhor traduzida como primária. Ver John Bellamy Foster, Brett Clark, e Hannah Holleman, “Capitalism and Robbery,” Monthly Review 71, no. 7 (December 2019): 1–5.
75. Marx, Capital, vol. 1, 891–92, 894, 917.
76. Krätke, “Marx and World History,” 104.
77. Coulthard, Red Skin, White Masks, 152.
78. Marx, “Excerpts from M. M. Kovalevsky,” 407; Frantz Fanon, Black Skin, White Masks (New York: Grove, 2008), 191–98. A passagem de Fanon aqui foi retirada da seção intitulada “O Homem Negro e Hegel”. A epígrafe que abre o capítulo seguinte é de Marx.

Sobre os autores

John Bellamy Foster is editor of Monthly Review and a professor of sociology at the University of Oregon. 

Brett Clark is associate editor of Monthly Review and a professor of sociology at the University of Utah. 

Hannah Holleman is a director of the Monthly Review Foundation and an associate professor of sociology at Amherst College.

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